São Paulo, sexta-feira, 22 de setembro de 1995
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Alemanha ameaça reter verbas para Brasil

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BONN

O Bundestag (Parlamento alemão) ameaça congelar a participação da Alemanha no programa de proteção da floresta tropical (amazônica) em protesto contra eventuais mudanças na lei brasileira sobre as reservas indígenas.
A ameaça surgiu ontem e transformou a questão indígena na única sombra sobre a visita de Fernando Henrique Cardoso à Alemanha, encerrada ontem, e no geral bem-sucedida.
FHC discutiu a questão ontem pela manhã com o ministro para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento, Karl-Dieter Spranger, exatamente o responsável pelo lado alemão do programa.
Aos jornalistas brasileiros, Spranger limitou-se a dizer que "foram convincentes" as explicações de FHC a respeito dos problemas jurídicos ligados à questão.
O problema jurídico é este: o decreto 22 de 1991 (governo Collor) reserva para os povos indígenas 96 milhões de hectares, quase 12% do território brasileiro.
Grupos que crêem ter também direito a essas terras levaram a questão ao STF (Supremo Tribunal Federal), alegando que o decreto 22 fere o processo legal, ao não abrir espaço para argumentos que contradigam a decisão oficial.
FHC tem explicado que a pendência forçou o Ministério da Justiça a propor uma solução intermediária, que mantém a reserva de parte das terras para os indígenas, mas prevê a renegociação de outra parcela.
Spranger desmentiu que houvesse "irritação" em seu ministério com essa hipótese, conforme versão publicada anteontem pelo jornal "General Anzeiger" ("Anunciante Geral"), de Bonn.
Disse, ao contrário, ter "plena confiança de que o governo brasileiro vai continuar a implementar o processo de demarcação".
Para isso, a cooperação alemã é fundamental: a Alemanha forneceu 250 milhões de marcos (US$ 178 milhões) para o programa-piloto de proteção à floresta amazônica, sendo 30 milhões de marcos (US$ 21 milhões) para a demarcação.
Correspondem a 60% de toda a verba alocada pelo G-7, o clube dos sete países mais ricos do mundo, para essas finalidades.
Já para a mídia alemã, o ministério de Spranger informou que a questão fora "exaustivamente" discutida com FHC.
Também o presidente do Partido Verde alemão, Joseph Fischer, ouviu as explicações de FHC, mas preferiu deixar sua avaliação para depois, após uma análise mais ampla que seu partido faria junto às ONGs (organizações não-governamentais) ligadas ao tema.
A questão ressurgiria no último ato da visita de FHC, a inauguração, no Museu de Artes e Exposições, de uma mostra de fotos de satélites sobre a Amazônia.
No discurso, FHC passou uma mensagem indireta à platéia, ao mencionar as enormes dimensões das reservas indígenas. Só os 43 milhões de hectares já demarcados, disse o presidente, superam o tamanho de Portugal.
Repetiu a comparação que fizera na véspera, no jantar com o presidente Roman Herzog: os 96 milhões de hectares reservados aos indígenas correspondem ao tamanho somado de Islândia, Irlanda, Reino Unido, França, Espanha e Portugal.
Tudo isso para abrigar 240 mil indígenas, ou menos de 1% da população total do Brasil.

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