São Paulo, sábado, 30 de setembro de 1995
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Brasil não adota punição criminal para as empresas

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Na Europa, mais da metade dos crimes econômicos são cometidos por pessoas jurídicas. Com os crimes ambientais a situação é mais grave: quase sempre são praticados por empresas.
Este quadro levou um grande número de países europeus a adotar, nos últimos anos, leis que responsabilizam criminalmente as pessoas jurídicas.
Embora no Brasil o panorama não seja muito diferente, não há na legislação este tipo de previsão.
Em caso de crime econômico, financeiro, ambiental ou contra as relações de consumo, respondem penalmente os dirigentes da empresa, podendo esta ser punida administrativamente.
"Na Alemanha, esta espécie de criminalidade baixou bastante depois que foi adotada a nova lei, em 1986", conta Klaus Tiedemann, professor de Direito Penal da Universidade de Freiburg (Alemanha).
Ele participou esta semana do Seminário Internacional de Direito Penal Econômico, realizado em São Paulo pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim).
Segundo Tiedemann, a responsabilidade penal das pessoas jurídicas também é adotada na Austrália, Estados Unidos e Japão.
"E esta responsabilidade não exclui a das pessoas físicas que dirigem estas empresas. São punidos os dois: a companhia e os seus dirigentes", explica Tiedemann.
Nos crimes contra o meio ambiente na Alemanha, as pessoas jurídicas responsáveis são obrigadas a reparar o dano, a criar e instalar mecanismos antipoluentes (enquanto isto não for feito a empresa não pode continuar produzindo) e a indenizar as populações atingidas, entre outras coisas.
Exemplo
Um exemplo mundialmente conhecido ocorreu com a Sandoz, fabricante suíça de produtos químicos e farmacêuticos, que em novembro de 1986 despejou toneladas de veneno no rio Reno.
Segundo Tiedemann, a companhia suíça foi condenada a limpar o rio, repovoá-lo de peixes e a desenvolver novas técnicas de produção e estocagem não-poluentes.
Além disso, foi obrigada a pagar indenizações aos pescadores e aos municípios que consumiam água do rio para beber, tendo também que arcar com o abastecimento de água dessas populações até o Reno voltar ao normal.
"Esta política de punição tem consequências sobre todo o sistema de produção da empresa, pois ela é obrigada a se adequar às regras sob pena de não voltar a funcionar. Isso não acontece se ela for apenas multada ou os dirigentes responsáveis forem presos, pois a companhia continua a funcionar", comenta o professor alemão.
Nos crimes econômicos e financeiros, as empresas alemãs podem ser condenadas a pagar em dobro ou triplo o dano causado.
Elas podem deixar de auferir vantagens fiscais por até cinco anos. Há também a proibição de negociar em bolsas de valores, como outra forma de punição.
Em casos muito graves -quando a empresa é reincidente ou quando se comprova que desde o início ela tinha uma atividade fraudulenta- a pena é de extinção da pessoa jurídica.
Tiedemann não concorda com o fato de a Constituição brasileira não admitir a responsabilização penal das pessoas jurídicas.
"A França e a Itália têm constituições quase iguais à do Brasil e adotam este modelo criminal."

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