São Paulo, segunda-feira, 1 de janeiro de 1996
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Satanização

MARCELO BERABA

SÃO PAULO - Vamos distinguir três aspectos na questão da Igreja Universal: o criminal, o jornalístico e o religioso.
O aspecto religioso, se tratado sem hipocrisia, é o mais simples. A Constituição assegura a liberdade de crença e o livre exercício dos cultos religiosos.
Quais são os senões religiosos feitos à Igreja Universal? Seria uma igreja mercantilista, que promete benefícios espirituais e materiais em troca de contribuições financeiras e que explora a ignorância do povo.
Bom, e que religião vive sem contribuições? E que fiel não contribui para a expansão da sua religião? E que religião não explora as carências e a ignorância das pessoas?
Os pastores da Igreja Universal seriam criminosos porque fazem contrabando, sonegam impostos, mantêm caixa dois, têm ligações com o narcotráfico? É possível que sim. A TV Record foi comprada irregularmente? Idem.
A apuração desses crimes está nas mãos da Polícia Federal, da Receita e da Procuradoria da República, que deveriam estar sendo mais ágeis.
Os crimes denunciados são antigos e conhecidos. Alguns já vêm sendo investigados há anos. Se essas instituições fossem realmente sérias, os resultados das investigações deveriam estar concluídos há tempo e as fitas do pastor dissidente seriam apenas documentos ilustrativos dos ilícitos. Estão sendo, no entanto, até este momento, as únicas (e frágeis) peças acusatórias.
E há, por fim, a participação histérica da imprensa.
De tempos em tempos assistimos a fenômenos como esse: a imprensa perde suas referências, esquece os procedimentos mínimos de investigação, ignora a necessidade de se buscarem provas, dá como verdade qualquer denúncia, priva os acusados do direito de expor sua própria versão, manipula informações, pré-julga, sataniza as pessoas e as expõe a linchamento público.
Se olharmos a imprensa com perspectiva histórica, verificamos que vem paulatinamente melhorando. É mais precisa, imparcial e objetiva. Mas tem recaídas como essa que a desmoralizam.
O problema dessa cobertura, em que as informações são frequentemente substituídas por versões e em que inexiste compromisso com a verdade, é que a imprensa pode sair mais desgastada do que a Igreja Universal.

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