São Paulo, quinta-feira, 4 de janeiro de 1996
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Talento dos jogadores salva dirigentes

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

A capacidade de renovação e geração de bons jogadores no futebol brasileiro é inversamente proporcional à destreza gerencial de seus dirigentes. Essa contradição está no âmago do nosso esporte mais popular, cujos êxitos em Copas do Mundo -que poderiam ser ainda maiores- acabam servindo para minimizar as monstruosidades dos responsáveis por campeonatos e calendários nesta terra da bola e do sol.
O ano de 95 foi, mais uma vez, marcado por essa anomalia: imaginação no campo -com a boa nova da crescente sofisticação dos técnicos- e improvisação e atraso na organização. A começar pelo omisso, para dizer o mínimo, presidente da Confederação Brasileira.
Tento imaginar num país como a Itália, onde futebol é coisa séria, o dirigente máximo do esporte sair de cena (na verdade sem nunca ter entrado) num momento grave como foi a explosão de violência das torcidas organizadas.
As trapalhadas dos dirigentes não se resumiram, evidentemente, ao âmbito da CBF, nem tampouco podem ser estendidas a todos os clubes -o "pé no chão" do Santos e a persistência de Montenegro, no Botafogo, são provas disso.
Mas a mentalidade do improviso e da descrença no trabalho, já não digo de longo, mas de médio prazo, tiveram momentos de glória. O mais longo foi protagonizado por Kleber Leite, do Flamengo.
Se teve o mérito de sacudir o futebol do Rio, com a contratação de Romário, o presidente rubro-negro demonstrou, para um homem de sucesso empresarial, espantoso desprezo pelo profissionalismo.
Mas as bobagens dos dirigentes não foram suficientes para impedir, dentro do campo, que o futebol desse alguns felizes passos à frente.
Passos como a certeza de que há dois novos talentos numa faixa de campo há pouco deserta: Juninho e Giovanni. Dupla que todos esperam um dia ver em ação com a camisa brasileira -já que o tal "número 1" deve ser encarado mais como ilustração funcional do que como restrição à convivência de craques, certo?
Passos, também, como absorção de um sentido de marcação menos robotizado do que o imposto por Parreira na Copa de 94 -como colocaram em prática Paulo Autuori, no Botafogo, e Zagallo, na seleção.
Passos, ainda, como a tentativa de conciliar a defesa com a retomada da vocação ofensiva, o que se viu claramente no Botafogo, mas igualmente, mesmo com altos e baixos, no Santos da reta final, no Corinthians da primeira metade da temporada, no Palmeiras dos melhores momentos ou no próprio Fluminense de alguns imprevisíveis lampejos.
Muitos acrescentariam ao rol dos avanços a competitividade demonstrada pelo Grêmio. Aqui, prefiro ser cego com Ray Charles ou Stevie Wonder e lúcido como Tostão ou Kissinger -que mostrou que entende no programa "Manhattan Connection", da Globosat.
Esse negócio de time de "pegada" pode funcionar, mas não será da mentalidade do "full-contact" que o futebol brasileiro extrairá suas vantagens comparativas. Certo, Danrlei?

Excepcionalmente deixamos de publicar hoje a coluna de Matinas Suzuki Jr.

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