São Paulo, domingo, 7 de janeiro de 1996
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Favorito acha que 'tem perfil'

ESPECIAL PARA A FOLHA, DE LISBOA

O favorito nas eleições, Jorge Sampaio, já assumiu o discurso presidencial. Não ataca diretamente Cavaco Silva e apresenta posições acima dos partidos.
Advogado, 56 anos, Sampaio começou na política na Faculdade de Direito, em que dirigiu o movimento estudantil de contestação ao regime salazarista, em 1961 e 62. Depois de formado, foi advogado de presos políticos.
No Partido Socialista, foi secretário-geral de 1989 a 91, ano em que foi derrotado nas eleições por Cavaco Silva -que obteve sua segunda maioria absoluta.
Na direção do partido, seu maior feito foi vencer as eleições para a Prefeitura de Lisboa, derrotando a direita que havia dez anos dirigia a capital. Foi na cidade, cruzando o rio Tejo de barco, que Sampaio falou à Folha:
*
Folha - Se for eleito presidente, o que o senhor propõe a respeito das relações com o Brasil?
Jorge Sampaio - Penso que há dois grandes objetivos. Primeiro, o nosso empenho no sentido de consolidar a comunidade dos sete países de língua portuguesa. Penso que isso é urgente.
Quanto às relações bilaterais, depois da visita do presidente Fernando Henrique, julgo que estamos numa fase que implicaria a percepção de que há componentes regionais que preocupam por um lado o Brasil e por outro Portugal.
Devemos ser suficientemente maduros para compreender que há países em estados de desenvolvimento diferentes, mas que têm todas as condições para descobrir novos patamares de cooperação.
Folha - Como o senhor pretende incentivar as relações entre os dois países?
Sampaio - Pretendo ser, sobretudo, um permanente incentivador dessas relações. De um lado, para contribuir que desapareça qualquer mal entendido e ser um referência para a estabilidade das relações bilaterais.
Mas, ao mesmo tempo, lançar as pistas de novos desígnios estratégicos e, em colaboração com o governo, fazer com que haja um novo tipo de relacionamento mais fecundo e promissor tanto na área cultural, como, por exemplo, na edição de livros, como no campo científico e no empresarial.
Folha - Num gesto simbólico, o premiê afirmou que a primeira viagem dele fora da Europa seria para o Brasil. E o senhor?
Sampaio - É sempre um grande prazer ir ao Brasil. Esse será um objetivo que tratarei com o governo. Penso que as viagens têm que ser resultado de acordos com o governo, adequando-se aos objetivos da política externa.
Folha - Como o senhor explica ter apoio desde a extrema esquerda até os fundadores da Democracia Cristã, de direita?
Sampaio - Isso significa uma responsabilidade minha, mas ao mesmo tempo mostra isenção e independência em relação a todas as forças que me têm apoiado. Por outro lado, julgo que a aposta que esse conjunto de setores faz na minha personalidade é porque sua leitura do exercício da Presidência se encaixa em meu perfil.
Folha - O senhor não considera esse apoio como um movimento de rejeição à candidatura de Cavaco Silva?
Sampaio - Acho que há um ponto fortemente motivador nesta candidatura que tem a ver com as pessoas, e isso é positivo para a democracia portuguesa. Tenho proposto uma espécie de reconciliação cívica dos portugueses com a política. Penso que temos que ter objetivos nacionais estratégicos, com que muitas pessoas de cores diferentes se possam identificar.
Folha - O que vai mudar após dez anos de governo de Cavaco Silva e Presidência de Mário Soares?
Sampaio - Julgo que estamos diante da possibilidade para uma nova maneira de fazer política. Será uma política mais aberta ao diálogo, com mais informação, com mais negociação e acordos.
Ao mesmo tempo, acredito que esse novo ciclo vai introduzir preocupações sociais e solidariedade. Julgo que foi isso que faltou no ciclo anterior. O que está em jogo nesse momento é ter um presidente acima dos partidos, que seja isento, represente a identidade nacional e, ao mesmo tempo, seja um fator de estabilidade. Estamos num período difícil.
Folha - O senhor acredita que vem aí uma crise?
Sampaio - É normalmente nos anos mais difíceis que os socialistas chegam ao poder.

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