São Paulo, sábado, 13 de janeiro de 1996
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Decreto não prejudica índios, diz entidade

EMANUEL NERI
DA REPORTAGEM LOCAL

O antropólogo Carlos Alberto Ricardo, secretário-executivo do Instituto Socioambiental, afirma que o decreto sobre demarcações indígenas "não gera nenhum tipo de direito" que beneficie setores contrários aos índios.
Para ele, o decreto cria apenas a possibilidade de uma pessoa que se sinta prejudicada pelas demarcações "apresentar uma reclamação por via administrativa" ao governo. Isso não significa, segundo ele, que a queixa será aceita.
Ricardo discorda daqueles que acham que a decisão do governo beneficia "grileiros" e madeireiros que invadem terras indígenas.
"É pouco provável que alguém que roube terra indígena entre com reclamação para reconhecer essa terra", afirma.
O advogado Dalmo Dallari, da Comissão Pró-Índio, disse à Folha que o decreto pode favorecer pessoas que se apossam de terras alheias, como os "grileiros". "Ninguém vai reivindicar título de terra roubada", diz Ricardo.
O Instituto Socioambiental, uma das maiores entidades do país ligada à questão indígena, já foi dirigida por Márcio Santilli, atual presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio).
Ricardo acredita que, das 547 áreas indígenas do país, pelo menos 205 "estão absolutamente fora" do alcance do novo decreto. Trata-se das áreas já homologadas e registradas em cartório e no patrimônio da União.
Entre essas áreas, segundo Ricardo, está a reserva ianomâmi, nos Estados do Amazonas e Roraima, com 9,6 milhões de hectares. Na opinião dele, também fica de fora o Parque Indígena do Xingu, no Mato Grosso, com 2,6 milhões de hectares.
O Instituto Socioambiental tem posição sobre as medidas oficiais diferente das demais ONGs (organizações não-governamentais) que trabalham com índios. A entidade vê defeitos, mas também aponta qualidades nas medidas oficiais.
Ricardo elogia as homologações de reservas indígenas que estão sendo feitas pelo presidente. Dezessete dessas áreas foram homologadas nesta semana. Outras quatro devem ser anunciadas na próxima semana.
Ricardo acredita que o governo poderia aproveitar a oportunidade para homologar mais 31 reservas cujos processos estão na mesa do ministro Nelson Jobim, da Justiça.
Críticas
Mas o secretário do Instituto Socioambiental também critica o decreto.
Ricardo acredita que pode provocar uma "avalanche" de recursos contra as demarcações. "O Estado vai ter agora que digerir esta tormenta que ele mesmo está aprontando", afirma.
Para Ricardo, o decreto do governo era desnecessário. "O que ele vai fazer é protelar o processo de consolidação das demarcações de terras indígenas", diz.
"Pode se converter no futuro numa catástrofe política para os índios." "Em si mesmo o decreto é péssimo", diz.
Segundo ele, não havia necessidade de se abrir um "canal administrativo" para atender queixas de pessoas que se sentem prejudicadas pelas demarcações. "Para esses casos já havia a Justiça para se recorrer".

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