São Paulo, sábado, 13 de janeiro de 1996
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Editor travou luta contra o regime militar

AZIZ FILHO
EDITOR FEZ RESISTÊNCIA AO GOVERNO MILITAR

Escritores e intelectuais que estiveram ontem no velório de Ênio Silveira foram unânimes em definir o editor como um dos homens mais importantes da luta contra o regime militar (1964-85).
O presidente da Academia Brasileira de Letras, Antônio Houaiss, disse que Silveira foi "o baluarte da luta contra a ditadura". Segundo ele, o editor teve seu patrimônio destruído pelas pressões dos militares sobre a editora Civilização Brasileira.
Um dos maiores amigos de Silveira, o poeta Moacyr Félix relembrou as noites em que ele e Silveira transportavam os procurados pelos militares até as embaixadas, em busca de asilo político.
O governador de Pernambuco, Miguel Arraes (PSB), foi levado por Silveira até a embaixada da Argélia, país onde o então governador derrubado se exilou.
"O Ênio era o eixo principal de todos os movimentos contra o golpe. Muitos manifestos políticos não existiriam se não fosse ele", disse o poeta.
O escritor Carlos Heitor Cony, colunista da Folha, disse que "a reação moral contra o golpe tinha um nome: Ênio Silveira". Segundo Cony, Silveira "tinha a força de aglutinar toda a inteligência brasileira na reação ao golpe".
"Ele era um homem rico e bonito. Poderia fazer o que quisesse. Preferiu arriscar tudo, inclusive seu patrimônio. Afirmo que foi o homem mais importante da luta contra a ditadura e sua maior vítima", disse Cony.
O poeta Ferreira Gullar contou que, em 1964, os exemplares de seu livro "Cultura Posta Em Questão", lançado pela Editora Universitária, foram apreendidos e queimados pelos militares.
"Um ano depois, o Ênio editou, dizendo que era uma questão de honra. Até eu fiquei receoso", disse Gullar. Silveira editou também o livro "Poema Sujo", que Gullar gravou no exílio na Argentina em uma fita, levada a Silveira por Vinicius de Moraes.
"Quando editou meu livro 'Conto Para as Transformações do Homem', o Ênio colocou em frente à livraria uma faixa dizendo que a poesia é a arma do povo contra a tirania'. Foi preso, é claro", disse Moacyr Félix, relatando uma das sete vezes em que Silveira foi preso pelos militares.
Para o escritor e frade dominicano Frei Betto, padrinho de uma das filhas de Silveira, o editor foi "o grande inspirador da intelligentsia brasileira". Apesar de ser ligado ao Partido Comunista, Silveira, segundo Frei Betto, "nunca foi militante de carteirinha nem aceitava aquela coisa ortodoxa".
O jornalista Millôr Fernandes disse que Silveira "foi um editor com uma linha direta, socialista, e levou isto até o ponto da ingenuidade".

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