São Paulo, domingo, 14 de janeiro de 1996
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Ex-dona-de-casa cria grife de lingerie para jovens

EDUARDO BELO
DA REPORTAGEM LOCAL

Ela estudou para cuidar da mente, mas hoje está mais preocupada com o corpo. Maria Valéria Jebrini, 38, psicóloga formada em 80, quer revolucionar o mercado nacional de lingerie.
Há dois meses abriu uma loja nos Jardins (zona sul de São Paulo) do que ela chama de "primeira grife brasileira de lingerie".
A marca Movimento Natural, destinada "às jovens e à mulher moderna", nasceu de uma vontade antiga de Valéria. "Eu sempre tive vontade de fazer uma coisa bem 'boladinha'. O mercado não absorvia por causa do preço", conta.
Os apelos são os tecidos naturais -como algodão-, o visual "limpo", durabilidade e conforto.
"O país que a gente vive é tropical. Ele exige uma lingerie leve. A mulher hoje quer uma coisa confortável e de qualidade. O público quer preço, mas também quer qualidade."
A própria empresa desenvolve o tecido -responsabilidade de Jabbour, irmão mais novo de Valéria-, os modelos, a estampa. A coleção é fabricada por duas ou três semanas. As peças mais procuradas têm uma segunda rodada de produção e só. Não são mais repetidas. Muda tudo. O lançamento da marca consumiu investimento de US$ 1,2 milhão.
Agora Valéria se prepara para abrir novas lojas -inclusive pelo sistema de franquia- e para lançar outra novidade no mercado nacional: a linha masculina, prevista para fevereiro. Nesse ponto, vai praticamente concorrer com o marido, Saad, 42, industrial do ramo de cuecas samba-canção.
"Eu queria trabalhar com ele, mas ele não deixou. Hoje eu agradeço. Se eu tivesse ficado lá, teria até atrofiado", brinca. Apesar da afinidade, Valéria diz um não interfere no negócio do outro.
A idéia da loja surgiu da vontade de dar um lingerie para a filha. "Tenho uma filha de 17 anos e não conseguia comprar para ela um lingerie que eu gostava. Esse produto hoje é hoje é muito sofisticado, mas não tem a cara de uma jovem. Eu queria uma coisa sem muita renda, mais 'clean'."
O resultado é que a própria filha, Caroline, acabou participando ativamente da criação da marca. Tanto que conquistou o direito de cuidar da loja (na esquina das ruas Oscar Freire e Consolação), ao lado de uma gerente.
"Ela foi minha maior consultora. Dizia o que gostava e até desaprovava algumas coisas."
A chegada de Valéria ao mundo dos negócios foi quase acidental. Em 1985, ela era uma dona-de-casa formada em psicologia sem nunca ter exercido a profissão. Acabara de ter o segundo filho e estava decidida a trabalhar. Queria montar seu consultório.
Chamada pelo irmão mais velho, Youssef, para trabalhar na Pub Moda Íntima, a fábrica de que hoje é presidente, Valéria reagiu espantada.
"Eu não entendia nem o que era uma duplicata." Começou a trabalhar na Pub naquele mesmo ano. "Comecei como aprendiz, como irmã do dono. Eu tinha muito interesse em mostrar do que eu era capaz, porque até então eu era conhecida na família como a dona do shopping. Vivia em shopping, fazendo compra", conta.
A família cobrava. "Como eu sempre fui a gastona, a preocupada com moda, com viagem, ninguém acreditava que eu fosse capaz de fazer um trabalho sério".
Aos poucos, Valéria foi passando dos registros contábeis para atividades ligadas à produção. "De repente eu comecei a desenvolver modelos. Hoje sou apoixanada pelo comércio e pela indústria."
Com a morte do irmão, há dois anos, Valéria começou a imprimir um tom mais pessoal à empresa. Há um ano, surgiu a idéia de mudar o perfil da Pub.
Ela aproveitou um investimento de US$ 1,5 milhão feito por Youssef em oito modernos teares eletrônicos da marca alemã Mayer.
As máquinas permitem à fábrica produzir 900 mil peças de lingerie por mês da marca Pub, a linha tradicional da empresa.
Com o surgimento da Movimento Natural, a idéia é aumentar a produção e multiplicar o faturamento. Se for alcançada a meta estabelecida para daqui um ano -250 mil peças/mês- a nova marca, mais cara, vai responder por metade do faturamento.
Antes da Movimento Natural a empresa vendia cerca de US$ 20 milhões por ano.
"Resolvi crescer investindo em outro mercado", afirma. Para ela, não havia outro meio de crescer -ou pelo menos manter o faturamento- desde que a política recessiva começou a surtir efeito, no segundo trimestre deste ano. Valéria conta que pretende inovar sem sair do ramo de lingerie.
"Quando eu comecei, o perfil da empresa era muito popular. Muito mais popular do que é hoje nos magazines. Era uma mercadoria bem básica, barata, de competitividade totalmente baseada no preço. Por isso que surgiu a Movimento Natural, porque ela me frustrava um pouco, me bloqueava a partir do momento que eu queria criar e não podia, porque esbarrava no preço."
Para chegar ao novo produto, Valéria consumiu um ano em testes de tecido, estampas e até aviamentos (elástico, seda e laço).
Em seguida, descobriu que seria difícil vender a produção nos magazines. Nas grandes redes, o que comanda as vendas é preço, diz a empresária. Foi então que surgiu a idéia de abrir a loja própria.

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