São Paulo, segunda-feira, 15 de janeiro de 1996
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Ex-exilados proclamam neoliberalismo maior inimigo

RONI LIMA
DA SUCURSAL DO RIO

Jantar convocado por militantes de esquerda banidos pelo regime militar na década de 70, sábado à noite no Rio, serviu para mostrar que, mesmo com algumas divergências de ação, os ex-guerrilheiros têm hoje um inimigo comum, o neoliberalismo, repudiado por todos os participantes do jantar.
O encontro foi a forma encontrada para comemorar o aniversário de 25 anos de liberdade de 70 presos políticos, soltos pelo regime militar em troca da vida do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher, então sequestrado por grupos guerrilheiros.
Depois da libertação, no dia 13 de janeiro de 1971, todos embarcaram para o exílio, no Chile.
Compareceram ao jantar no restaurante Lamas, no Flamengo, 60 pessoas, entre elas 30 banidos pelo regime militar, amigos, parentes e convidados de vários Estados.
"Uns poucos viraram neoliberais. Mas estes não vieram", disse Jean Marc Von der Weid, 49, ex-presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) e hoje filiado ao PSB.
"Eu gostaria que você fizesse outro tipo de pergunta. Hoje queremos festejar o aniversário de nossa liberdade", desconversou Francisco Mendes, 52, um dos organizadores do jantar e membro do PSB no Rio.
A pergunta era se havia algum neoliberal no grupo remanescente dos 70 ex-banidos. Dos presos políticos que foram soltos em troca da vida do embaixador suíço, pelo menos 55 estão vivos.
"Tem gente que disse que está cuidando da própria vida, que não quer saber de política. Por isso, não quis vir ", disse Luiz Alberto Sanz, 52, simpatizante do movimento anarquista. Ele disse votar em partidos como o PT.
Já a necessidade ou não da luta armada ainda divide os chamados progressistas.
Alguns deles ainda admitem a necessidade "histórica" da luta armada, enquanto outros repudiam os métodos violentos de se fazer política. Ideologias à parte, o grupo conta hoje até com simpatizantes do movimento anarquista.
Em meio a muitos copos de chope, taças de vinho branco chileno, recortes de jornais e fotos da época, Elinor Brito, filiado ao PDT, afirmou admitir a necessidade da luta armada "dependendo da condição histórica".
"Um encontro como este revitaliza a gente. Não para ficar no saudosismo, mas para avaliar a nossa trajetória histórica e continuarmos nossa luta para mudar essa situação social injusta", disse o advogado Irany Campos, 57.
Morando em Belo Horizonte e "militante engajado do PT", Campos disse que não poderia faltar ao jantar, que reuniu cerca de 60 pessoas no total.
Como ele, ex-companheiros de luta política e, muitas vezes, armada contra o regime militar voltaram no tempo, passando horas a fio rememorando fatos do passado.
Sucesso fez um dos organizadores do jantar, o "anarquista" Sanz, professor de jornalismo, ao levar recortes de jornais da época da libertação do grupo. Os jornais foram guardados por sua mãe, a ex-atriz Luíza Barreto Leite.
"Salvo o suíço com os banidos no Chile", "Já no Chile os banidos" -diziam as manchetes de jornais de 14 de janeiro de 1971, informando que os 70 presos já tinham ido para o Chile.
Iniciado às 22h de sábado, o jantar entrou pela madrugada no restaurante Lamas, tradicional ponto de encontro da esquerda carioca.

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