São Paulo, quarta-feira, 17 de janeiro de 1996
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As fraquezas do Rambo

JANIO DE FREITAS

O novo Rambo da modernização à brasileira, saudado pela decisão de cortar os vencimentos do funcionalismo catarinense sempre que a folha ultrapassar 65% da arrecadação, está sendo beneficiado pelo desconhecimento, fora do seu Estado, de que ele é também o vilão da história. Foi o próprio governador Paulo Afonso Vieira que, muito ao contrário da imagem que lhe é atribuída, inchou a folha do funcionalismo, terminando por recorrer à solução extrema da ilegalidade.
Ao deixar o governo em abril de 94 para candidatar-se a senador, Vilson Kleinubing passou ao sucessor Antônio Carlos Konder Reis um Estado com receita de R$ 102 milhões, dos quais o gasto com o funcionalismo consumia 75%. A competência de Konder Reis, já demonstrada em governo anterior e quando congressista, confirmou-se no que entregou a Paulo Afonso Vieira em janeiro de 95: a arrecadação subira para R$ 130 milhões, que o funcionalismo comprometia em apenas 66%. Uma casa em ordem, portanto.
Meio ano depois, a receita caíra para R$ 128 milhões e o funcionalismo estava consumindo 89,5% dela, com a folha em inacreditáveis R$ 115 milhões. E a desproporção, conduzida pela encoberta face de vilão do Rambo, chegou ao fim do ano sem atenuação substancial, apesar da melhoria de receita.
Enquanto as administrações brasileiras se valerem de cargos em comissão, em vez da carreira que o ministro Bresser Pereira esqueceu na sua "reforma" administrativa, ficam abertas as portas para o fisiologismo político. Paulo Afonso Vieira, por exemplo, concedeu logo o aumento de 90% para os ocupantes de cargos comissionados. Ou seja, para aqueles que nomeara ou mantivera por serem seus correligionários políticos. Os aumentos para outros níveis e diferentes atividades, como era de esperar, seguiram-se em torrente.
Não faltaram advertências de que o governo, naquela cadência, não conseguiria pagar o 13º salário. Mas Paulo Afonso Vieira pagou-o em dia. À custa, porém, do comprometimento, em várias operações financeiras, da arrecadação futura do Estado. Estava assim antevisto em dezembro o estrangulamento que viria em janeiro.
O senador Vilson Kleinubing começa hoje a tornar públicos alguns aspectos ainda mais graves da "modernizante" administração de Paulo Afonso Vieira. Um deles é uma operação de debêntures, usando ações possuídas pelo Estado, para fazer R$ 100 milhões com que atenuar a falta de recursos -mas a operação foi feita sem a necessária concorrência. O senador diz-se informado, ainda, de que Paulo Afonso Vieira usou, também para os compromissos de fim de ano, do saldo de uma verba do Banco Interamericano de Desenvolvimento destinada, estritamente, à construção de estradas.
O corte dos vencimentos do funcionalismo está em suspenso, por decisão judicial de anteontem, que o considerou inconstitucional. Com uma bela advertência do desembargador João Martins ao Rambo e demais adeptos da "modernização" que não passa de prepotência: "O poder tem limites. As leis governam, não os homens. Por isso, não é sensato imaginar que o cumprimento de uma norma constitucional deva ser alcançado ao preço do descumprimento de outra".

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