São Paulo, quarta-feira, 17 de janeiro de 1996
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A César o que é de César

JULIO LOBOS

Os economistas calculam o custo Brasil, por ano, à altura da metade da dívida externa. Não importa se é chute. Nesse nível de cifras, qualquer chute é gol. Culpam-se, entre outros, os encargos sociais, que vão engordar as burras do governo. E quem mais condena é o empresariado. O caso mais recente é a falha do Tribunal Superior do Trabalho, concedendo 25% de reajuste salarial aos empregados do Banco do Brasil.
Ocorre que os juízes agem influenciados pela realidade, e essa aponta para reajustes salariais iguais ou acima da inflação oficial, sendo concedidos pelo setor privado desde que o Plano Cruzado veio à tona. Só muito recentemente é que começou a se detectar um arrefecimento da generosidade dos negociadores patronais. Então, aquele que se considera inocente que jogue a primeira pedra.
O episódio deveria propiciar uma reflexão mais profunda sobre o tema. Quanto à mão-de-obra, o alto custo Brasil não se deve apenas a encargos sociais arbitrários, mas também a decisões tomadas voluntariamente na mesa de negociações, nos últimos 15 anos. Uma das maiores empresas metalúrgicas de São Bernardo do Campo hoje paga adicional noturno... a partir das 18 horas. Uma fabricante de pneus localizada em Santo André arca com todos os custos de alimentação e de transporte dos seus mais de 3.000 funcionários. Empresas do setor papeleiro em São Paulo pagam um abono de férias equivalente a 60% do salário, além dos 33% constitucionais. E assim por diante. Por que, então, se indignar pelo fato de a Petrobrás pagar adicional de periculosidade a todos os seus funcionários, inclusive aos que trabalham na sede da empresa, bem no centro do Rio de Janeiro? (Ainda que, pensando melhor, daqui a pouco um adicional desses acabará sendo muito bem merecido.)
Um outro fator de acréscimo de custos de mão-de-obra é o modelo de negociação coletiva, altamente corporativista, que se pratica no país. Modelo que dá guarida a acertos entre sindicatos patronais e trabalhistas, em que as diferenças de tamanho ou desempenho econômico, existentes entre as empresas, não contam. Isso acarreta duas consequências perversas: aumentos salariais iguais para empresas diferentes dentro de um mesmo setor econômico, e reajustes salariais semelhantes para setores econômicos diferentes. Assim sendo, o salário de um cervejeiro da Brahma acaba sendo reajustado nos mesmos termos que os de um colega da Antarctica, e esse reajuste não destoa muito do destinado a um trabalhador da Villares, da Klabin ou do Banco de Boston. Obviamente, isso é uma aberração.
Longe de mim pleitear a condenação à morte, por inanição, dos trabalhadores do Brasil. Pretendo somente mostrar aqui que parte do custo Brasil atribuído à mão-de-obra não é responsabilidade de Getúlio Vargas, do governo de turno da Petrobrás ou do Tribunal Superior do Trabalho. Ele resulta da capacidade negociadora pouco criativa e nada audaciosa que caracteriza o setor privado mesmo.
Apenas acho conveniente pôr as coisas, ou as críticas, se preferir, nos seus devidos lugares.

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