São Paulo, domingo, 21 de janeiro de 1996
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Reformando com habilidade

ANTONIO KANDIR

Os termos da negociação com as centrais sindicais em torno da Previdência representam avanço importante. Mas a reforma da Previdência continua em pauta e os termos informalmente acordados, se aprovados no Congresso, não devem significar impedimento para que se aprofundem mais à frente os avanços obtidos agora.
Dentre os avanços, destaco três. O critério de tempo de serviço para tempo de contribuição. Faz diferença um ou outro critério para o equilíbrio de receitas e despesas previdenciárias ao longo do tempo? Faz diferença importante, tanto maior quanto mais se alongue a expectativa de vida no Brasil, fenômeno que já vem ocorrendo.
Com a mudança de critério, fica estabelecida base mais adequada para recuperar e manter o equilíbrio do sistema, dado que a nova regra limita a desproporção entre recursos acumulados nos anos de contribuição e tempo de usufruto dos benefícios. Resta saber se a nova regra é suficiente para assegurar o equilíbrio atuarial do sistema. Se não for, novas mudanças se farão necessárias no futuro.
O segundo avanço importante refere-se ao regime de aposentadoria dos funcionários públicos, mudança que deve ser complementada no Congresso para que se corrija a distorção que é gastar-se aproximadamente a mesma coisa pagando benefícios do INSS, que cobre 90% da população segurada, e dos regimes especiais, que cobrem apenas 10%, grande parte deles pertencente ao setor público.
Pelo acordo, mantém-se a aposentadoria integral, mas será necessário cumprir três requisitos. Ter idade mínima de 55 anos (homens); e 50 (mulheres); e tempo mínimo de contribuição de 35 e 30 anos, respectivamente; e no mínimo dez anos no serviço público.
O terceiro avanço importante é político e consiste em fixar "jurisprudência", segundo a qual as negociações de matérias de ampla repercussão devem incorporar representantes dos setores sociais implicados. Isso não significa desrespeito às prerrogativas do Congresso, que poderá rejeitar ou modificar os termos de eventuais acordos firmados diretamente com os setores sociais interessados.
A incorporação das centrais sindicais às negociações em torno da Previdência marca um estilo político de fazer mudanças. Seu mérito imediato é criar condições políticas para mudanças importantes e impopulares num ano eleitoral.
Seu mérito a longo prazo será avaliado pelos desdobramentos políticos do acordo. Se decorrerem condições propícias para avançar de modo gradual e permanente nas reformas, valeu a pena. Se significar engessamento do processo de mudança, os custos serão, no futuro, mais altos do que os benefícios obtidos agora.

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