São Paulo, domingo, 21 de janeiro de 1996
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os queridos anônimos da cidade

Caras conhecidas entregam quem são seus heróis desconhecidos em São Paulo

Denise Fraga, carioca, atriz: "Klébi é a cara de São Paulo, uma coisa meio Rita Lee, poeta urbana, principalmente na música 'Emudecem a Paulista'".
A paulistana Klébi, 34, canta profissionalmente há 9 anos, mas ainda não viveu sucesso. Há algumas semanas, lançou seu primeiro CD, pelo selo Dabliú, de J.C. Costa Netto. Antes, havia mandado uma fita sua a Denise Fraga, que se encantou e começa a espalhar o nome. "As pessoas vivem cantando Bahia e Rio", diz Klébi, "por que não São Paulo?"

Ester Giobbi, decoradora, paulista: "Meu querido é o menino do sinal da Mário Ferraz. Tem um sorriso branquinho, bonito. O grande problema da cidade é essa criançada. Às vezes me assusto, me tranco. Mas ele faz parte do meu caminho, fiquei amiga. Quando ele vê meu carro, corre. Dei roupa de futebol, bola, até dólar".
Amauri dos Santos Ramos, 12, mora e estuda em Paraisópolis (zona sul), mas é popular na Cidade Jardim, onde vende chiclete. Gozador e fã de Marcelinho, quer ser "juiz corrupto". Acha que é "tudo ruim" em São Paulo. "É tudo uma besteira."

Henri I. Sobel, 52, presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista
"Minha grande amiga secreta é a síndica do prédio onde eu moro. Ela consegue administrar o nosso dia-a-dia com eficiência e dedicação. Encontra solução para tudo. Atualmente, a maioria das pessoas cria problemas. Dona Cynthia resolve problemas. Um prédio, mesmo um pequeno como o nosso, é uma microcidade. É uma pequena amostra da nossa metrópole. Dona Cynthia é minha amiga secreta por ser uma pessoa simples, boa e prestativa. Se houvesse mais donas cynthias, São Paulo seria melhor".
Cynthia Castanheira, 40 síndica de prédio em Higienópolis
Há 10 meses, a professora e tradutora Cynthia Castanheira aceitou o antipático cargo de síndica por duas razões: primeiro, para tentar conservar o imóvel em estilo art déco, construído em 1946, pelo arquiteto Jaime Fonseca Rodrigues. "Nada foi adulterado em 50 anos.". Para ela, "preservar é respeitar o espaço em que se vive, enriquecer o cotidiano, o auto-respeito e o convívio".

Isabel Staub Melão, gerente de propaganda do grupo Gradiente
"Meu amigo secreto é "Modesto", proprietário da banca de jornais da rua Sampaio Vidal, quase esquina com Maria Carolina, no Jardim Paulistano (zona oeste de São Paulo). Modesto é competente no trabalho, além de estar sempre de bom humor"
Jesus Modesto da Silva, o "Modesto", 32, cuidava de gado em Serra Talhada (PE). O dinheiro era curto. Veio para São Paulo ("uma cidade acolhedora") em 82. Começou como zelador. Juntou dinheiro e comprou a banca de jornal em 90. Persistiu no negócio mesmo no período duro em que, depois de perder o freio na estrada de Santos e bater de frente num caminhão, sofreu duas cirurgias para corrigir cicatrizes na face. Agora, quer ampliar sua banca, onde vende R$ 6.000 de jornais e revistas por mês: "A freguesia aqui do Jardim Paulistano é classe A. Merece o melhor".

Adriane Galisteu, 22, modelo
"Meu amigo secreto é a minha cabeleireira Rosa Kaneshi, que cuida do meu cabelo desde meu primeiro reflexo. Apesar de estar sempre viajando, dou um jeito de falar com ela, nem que seja pelo telefone. Adoro fofocar com a Rosa. É uma pessoa constante na minha vida. Mesmo depois que eu me mudar para a Haddock Lobo, continuarei mantendo contato com ela."
A cabeleireira Rosa Hiroko Kaneshi, 50, nasceu em Presidente Prudente (558 km a oeste de São Paulo), no interior de São Paulo. Após a morte do pai, japonês de Okinawa que imigrou para o Brasil aos 15 anos, mudou-se para São Paulo com a mãe e os irmãos. Instalou-se no bairro da Lapa (zona oeste), onde mora e trabalha até hoje. Conheceu Adriane Galisteu quando a menina tinha 5 anos. "Ela gostava de ficar na minha casa, conversava com todo mundo", conta. Além de cuidar das melenas da garota, Rosa trata também as da mãe da modelo. Por não ter casado nem tido filhos, considera Adriane quase como uma filha. "Ela é da família", define.

Bruna Lombardi, 41, apresentadora do "Gente de Expressão"
"Meu relacionamento com a Etel começou profissionalmente e depois virou amizade. Isso é típico de São Paulo. Ela é designer e bolou duas mesas de trabalho para mim. Eu a conheci há dois anos, e acabamos virando amigas. A Etel é uma pessoa muito interessante porque seu trabalho ultrapassa a feitura dos móveis. Ela tem uma filosofia de trabalho, está sempre buscando algo."
A designer Etel Carmona, 48, começou a mexer com carpintaria em seu sítio em Louveira (75 km a noroeste de São Paulo). Trabalhava a madeira por prazer. Os amigos foram descobrindo suas peças, e ela acabou profissionalizando o negócio. Há quase três anos, abriu no bairro de Pinheiros (zona oeste) a loja que leva seu nome. Foi lá que conheceu Bruna. "Ela veio indicada por uma amiga e se apaixonou por mim e pelos meus móveis", conta. Ano passado, Etel criou três peças para Bruna: duas mesas de escritório e um aparador. "Uma é um bureau simples que fica no quarto dela. A outra, linda, é em forma de meia-lua. Era um sonho dela que consegui viabilizar", diz. Casada com um comerciante, mãe de três filhos, Etel diz que faz "alta-costura de móveis" e considera seu trabalho "um resgate da figura do artesão".

Bob Coutinho, restaurateur e apresentador de TV
"Escolho o homem responsável pela confecção dos meus blazers, o alfaiate Antonio Jesus de Carvalho, da Horent Alfaiataria (rua Augusta 2690, tel. 64-2421). Acho que ele tem um caráter admirável. É uma pessoa em quem se pode confiar, um verdadeiro filósofo do trabalho".
"São Paulo é o melhor lugar do mundo. Trabalha-se muito, ganha-se bem, briga-se bastante", diz o alfaiate Antonio Jesus de Carvalho, 53 anos, natural de Aveiro, em Portugal, e que chegou aqui em 1955. Para ele, a "briga" começou aos 11, quando passou a ajudar o pai na alfaiataria. O pai voltou para Portugal e com apenas 17 anos Antonio assumiu sozinho o negócio. Já costurou para Jorge Ben no tempo em que todos queriam calça boca-de-sino e cintura saint-tropez. Fez clientela junto aos estudantes dos colégios paulistanos Dante Alighieri, São Luís e Bandeirantes, na década de 60. Viu as mudanças que afetaram aquela geração: "Em 1968, eles queriam calça e camisa. Agora, em altos cargos, só pedem ternos".

Brasil Vita, 73, paulista, presidente da Câmara dos Vereadores de São Paulo
O dr. Aranha, advogado negro que venceu preconceitos, é história viva da cidade".
Avelino de Oliveira Aranha, 70,define-se: "Como FHC, tenho um pé na senzala e outro na nobreza". Lendário no Centro por saber de cor e recitar a história de bairros, ruas e monumentos, gosta de esmiuçar sua árvore genealógica até chegar a Oswaldo Aranha, "um luminar".

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