São Paulo, terça-feira, 23 de janeiro de 1996
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Ipanema e o verão

ANTONIO CARLOS DE FARIA

RIO DE JANEIRO - Mais uma vez Ipanema lança moda e gera debates no verão. Os apitos anarco-maconheiros da rapaziada do posto 9 despertaram a opinião pública para um projeto de lei que tramita em quase silêncio no Congresso.
O projeto prevê uma nova política de drogas, propondo que os usuários não sejam mais presos, mas submetidos a multas e outras sanções. Se aprovado, será como uma carta de alforria para a juventude que se junta nos dias de sol.
O governador Marcello Alencar já disse que acaba "fumando um" para chegar a uma postura sobre a questão, desde que se prove que a maconha não causa mal à saúde. Mas, enquanto isso, e também enquanto a lei não muda, ele vai continuar a reprimir o uso da droga.
O governador fez as declarações num momento de descontração, alegre pelas promessas de verbas do presidente Fernando Henrique. As palavras espontâneas costumam revelar mais que os discursos elaborados.
Pena que nem tudo seja sol, sal e sul. O autoproclamado território livre de Ipanema tem de ser abastecido por alguém, e aí vem a contradição do povo chique e sofisticado que quer a droga, mas não quer a proximidade dos traficantes.
Se uns apitam para avisar que a polícia pode estragar a festa, outros ficam mais tranquilos quando ouvem o apito da polícia. Apitar ou não apitar, eis a questão.
A unidade motriz da violência na cidade é o narcotráfico, que faz girar à sua volta o contrabando de armas, os sequestros e os assaltos a banco, num fluxo e refluxo do crime proto-organizado.
A nova lei, que depende de aprovação dos congressistas e presidencial, quer a quebra do sigilo bancário para facilitar a investigação da polícia. O objetivo é que se chegue aos barões da droga e não só aos manés dos morros.
Ao relaxar a pena aos usuários e estreitar a porta do tráfico, o projeto revela o desejo de um mundo onde o consumo seja tolerado e sem a violência inerente à clandestinidade. Passo para a completa descriminação do uso, da produção e do comércio das drogas.

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