São Paulo, quarta-feira, 24 de janeiro de 1996
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Marcello e a maconha

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Não entendi direito a estratégia do governador Marcello Alencar a respeito da maconha. Ele teria ameaçado fumar uns baseados por aí para proceder a um juízo de valor sobre aquilo que os entendidos chamam de "Cannabis sativa". Louvo-o pela pretendida intenção, mas acredito que se possa chegar a uma opinião sem apelar para metodologia tão radical.
Recentemente, passei por um transe embaraçoso. As autoridades dos Estados Unidos, para permitirem minha presença em território americano, deram-me um questionário onde tive de responder se tinha intenções de assassinar o presidente Bill Clinton. Como até hoje nunca pensei seriamente em assassinar ninguém, muito menos uma pessoa que não conheço e que nada me fez de mal, fiquei com receio de trair minha consciência ou, o que é pior, de iludir as autoridades do país que generosamente me abrigaria por uns dias.
Acredito que fui sincero quando botei um x no quadradinho respectivo, ou seja, até aquele momento não nutria propósitos homicidas contra Bill Clinton. Agora, tomando conhecimento da intenção do nosso governador de fumar maconha para saber o que deve fazer, fico pensando se, antes de responder levianamente ao questionário americano, eu não deveria matar alguém, se não o próprio presidente ao menos um congressista do Alabama, um prefeito da Califórnia, um funcionário do aeroporto de Nova York.
Serei mais afoito. Suponhamos que uma autoridade qualquer deseje formar um juízo sobre o casamento entre homossexuais. Creio que se pode ter uma opinião formada (não necessariamente correta) sobre esse assunto sem precisar fazer aquilo, que no Nordeste, chamam de "convolar núpcias" com um praticante dessa forma alternativa de praticar sexo.
Conheço há anos o governador. Ele alegou que sua declaração fora uma brincadeira. Rogo aos deuses que aqui não se repita o caso do prefeito de Washington que foi preso fumando crack. Fumar "para ver como é que era" não diminuirá o vexame.

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