São Paulo, terça-feira, 30 de janeiro de 1996
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Especulação ou produção?

SYLVIO LAZZARINI NETO; SÉRGIO GIOVANETTI LAZZARINI; FÁBIO SANTOMAURO PISMEL

SYLVIO LAZZARINI NETO
A comercialização de gado de corte é tão antiga quanto a própria história do Brasil. Desde os tempos do Brasil Colônia até os dias atuais, a pecuária contribuiu para a ocupação do território brasileiro.
O boi liderou (e ainda tem liderado) a expansão da nossa fronteira agropecuária. Sendo, na maioria das vezes, uma atividade estabelecida em terras com menor valor (e, consequentemente, em fazendas de menor patrimônio), a pecuária de corte pôde se sustentar com baixas produtividades, tecnologia rudimentar e pouca preocupação em aspectos de gerência econômico-financeira.
Além disso, o boi gordo e os animais de reposição, sob o ambiente inflacionário que caracterizou o Brasil nos anos 80 e primeira metade dos anos 90, comportavam-se como ativos financeiros. A liquidez destes ativos era altíssima. Neste ambiente, estava inserida a figura do "catireiro", o típico comerciante de gado que ganhava dinheiro apenas comprando e vendendo.
A sua preocupação com índices de produtividade era nula. O gado, sob este aspecto, era mais uma moeda do que um ativo destinado à produção de carne e couro. Grandes retornos eram obtidos no investimento em pecuária, sem qualquer preocupação com tecnologia e gerenciamento. A especulação tomava lugar da produção.
O cenário agora é outro. A estabilização da economia demanda um novo posicionamento das empresas. Prova disso é que, arrastada por essa nova realidade, grande parte dos "catireiros" foi impelida a se retirar do mercado.
O gado que fazia parte dos estoques desses comerciantes está passando para o estoque dos verdadeiros produtores, o que, a longo prazo, deverá gerar ganhos de produtividade no rebanho brasileiro.
Sendo um mercado altamente competitivo, caracterizado por um grande número de empresas, a pecuária de corte não pode mais ser embasada em capital especulativo. Mercados competitivos, via de regra, não comportam altas rentabilidades. O "frenesi" pela pecuária, no passado, sustentou-se pela elevada demanda que o gado apresentava para fins de reserva de valor, o que não se espera no futuro.
Muitas empresas extrapecuária, que outrora aplicavam seus patrimônios em ativos como gado e fazendas, são impelidas agora a desmobilizar tais ativos, devido aos juros altos e ao aperto de crédito.
Estamos no divisor de águas entre um período especulativo e um período produtivo. Só irão conseguir rentabilidades satisfatórias produtores que procurarem delinear de forma estratégica seu sistema produtivo, antevendo mudanças, inovando em processos, adotando tecnologias de vanguarda e procurando otimizar o resultado econômico-financeiro.
A gerência financeira deve ser um insumo à potencialização dos resultados da atividade. A despreocupação generalizada sobre esses aspectos, na pecuária, é fato notório. Quantos pecuaristas efetuam controle de custos? Quantos decidem a aquisição de insumos e outros ativos com base em cálculo de relação benefício/custo? Quantos se utilizam de mercados futuros como instrumentos de administração de riscos? Poucos, é a resposta. E os que utilizam esses instrumentos de administração, se não estão plenamente satisfeitos com seus níveis de rentabilidade, ao menos continuam obtendo lucros.
A observação de aspectos econômico-financeiros é também importante para a adoção de tecnologias. A tecnologia deve se colocar a serviço da rentabilidade, nunca o contrário. Sob este aspecto, deve-se procurar não apenas maximizar produtividade. É preciso maximizar lucros -para produzir, não para especular. Neste sentido, a escolha da tecnologia mais adequada às particularidades de uma propriedade, sendo capaz de gerar o maior lucro, é a verdadeira tecnologia de ponta. Somente com um satisfatório resultado econômico-financeiro é que o processo produtivo ganha fôlego.
A pecuária de corte (e sua cadeia agroindustrial) desponta como um dos setores de maior potencial competitivo no futuro.
Entretanto, é importante que todos tenham em mente que a competitividade só se constrói com eficiência. Só os eficientes poderão conviver com esta nova ordem. Quem viver, verá.

Colaboraram SÉRGIO GIOVANETTI LAZZARINI e FÁBIO SANTOMAURO PISMEL.

SYLVIO LAZZARINI NETO, SÉRGIO GIOVANETTI LAZZARINI e FÁBIO SANTOMAURO PISMEL são consultores da Lazzarini & Associados Consultoria.

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