São Paulo, quarta-feira, 2 de outubro de 1996
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A caixa do banco

JANIO DE FREITAS

Uma só investigação não basta. Além da que o Banco Central confirma estar fazendo em torno de "operações financeiras de vários Estados e municípios" (o que jornalistas engajados publicaram como "confirmação de investigações sobre Celso Pitta"), tornou-se necessário investigar o envolvimento do Banco Central na disputa eleitoral paulistana.
A participação do governo Fernando Henrique Cardoso nas eleições, e não só em São Paulo, já atravessou há muito tempo os limites da imoralidade, ainda por cima praticada com desfaçatez sem precedentes. Contra a maior parte desse comprometimento imoral, não há defesa possível ao alcance do eleitorado e nem mesmo dos concorrentes prejudicados. O recurso à Justiça seria problemático, exigindo anos de tramitação e tendendo nos julgamentos finais, como de hábito, a favorecer os senhores do governo. Há que contar com a desmoralização, nada incomum, do descaramento.
Mas facilitar a impunidade mesmo quando há condições para combatê-la, aí já é tornar-se conivente. Não foi outra coisa que aconteceu quando, há pouco, ficou relevado o uso de dinheiro da Petrobrás para divulgar pesquisas fraudulentamente ao gosto continuísta de Fernando Henrique. A oposição preferiu silenciar a promover as providências que maculassem a imagem da sua santa Petrobrás. Nem mesmo algum dos acionistas, cujo ganho é reduzido pelos gastos indecentes da Petrobrás, animou-se a uma atitude qualquer. Bem que certas estatísticas dizem estar no Brasil o maior rebanho bovino do mundo.
Aconteceu há um ano e dez meses a operação financeira, com títulos da Prefeitura de São Paulo, agora introduzida na disputa eleitoral. Em todo esse tempo o Banco Central nada teve a fazer ou dizer sobre a transação, que só agora, nas aperturas do candidato governista, emergiu da escuridão do BC.
A natureza da operação, seus propósitos e autoria, o prejuízo ou o lucro para a Prefeitura de São Paulo -isso compõe um lado da questão. O outro é a má-fé da dubiedade com que o Banco Central interveio na disputa em São Paulo. Não ousou confirmar nem negar os termos e os números da acusação divulgada contra Celso Pitta, mas não deixou de divulgar que, de fato, investiga transações com títulos estaduais e municipais, permitindo ao jornalismo chapa-oficial o acréscimo óbvio: "inclusive as que envolveriam o candidato do PPB".
Até por isso faz-se necessária a providência que dificilmente haverá sobre o Banco Central: suas investigações, cujo âmbito legal é o de empresas e dirigentes do setor financeiro, estão agora alcançando os atos administrativos de governadores, prefeitos e secretários? Ou a atribuição dos tribunais de contas está assumida pelo BC ou é mentirosa a sua insinuação passiva de que tenha algo comprometedor contra algum candidato. Em qualquer caso, o Banco Central confirma que é muito mais, e pior, do que uma caixa preta e insondável.

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