São Paulo, quarta-feira, 2 de outubro de 1996
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Poder não muda de cor

ALZIRA RUFINO

Pelo menos 100 mil mulheres deverão concorrer às eleições municipais de 1996. As mulheres têm demonstrado que, se estavam ausentes do poder, não era por falta de competência, mas por barreiras seculares de preconceitos que têm dificultado seu acesso a funções de comando político e econômico. O quadro é menos otimista quando vemos a representação negra no Executivo e no Legislativo brasileiros. Entre os 594 congressistas, quantas são as negras? Benedita da Silva e Marina Silva. E é só.
Metade da população feminina é representada por mais de 30 congressistas, enquanto apenas duas parlamentares falam pela outra metade que é negra. Um passo decisivo para aumentar a representação feminina foi a aprovação do projeto de lei da deputada Marta Suplicy que impõe aos partidos uma cota de 20% de candidaturas de mulheres nas eleições de 1996.
Quantas dessas 100 mil mulheres candidatas em 1996 são negras? Nesse mundo de conquistas femininas, quantas negras se elegerão prefeitas e vereadoras? Porque o sistema de cotas não foi aplicado proporcionalmente a candidatas negras (deveríamos considerar também as indígenas), as mulheres negras, salvo raras exceções, nem sequer passaram pelo crivo das pré-candidaturas, desconsideradas pelas cúpulas dos partidos.
Ao verificarmos as estatísticas sobre os espaços políticos, econômicos e profissionais ocupados pelas mulheres, constatamos que o poder tem uma crescente composição feminina, permanecendo, no entanto, nas mãos da mesma etnia.
Anuário Estatístico Brasileiro de 1992 dá mais algumas informações importantes: as mulheres são atualmente 62% dos profissionais de medicina, 42% dos diplomados em direito, 19% em engenharia. Há um pequeno número de negras que superam a barreira da cor, mas quantas são nesse mercado de trabalho em que as mulheres já superaram a porcentagem masculina, como na medicina?
O Brasil tem ainda um longo processo pela frente para que a raça negra se organize e tenha poder econômico e político. Há, em nosso país, conflitos agudos provocados pela miséria dos que não têm terra, dos que não comem. Sabemos a cor da miséria em nosso país e sabemos que é a raça negra que terá de buscar seu espaço político.
As mulheres negras estão organizando-se com muito mais urgência, saindo dos tanques e fogões para a vida política, afirmando-se contra todas as negações, e estarão, com certeza, nas eleições municipais tentando melhorar as estatísticas, dando voz a cerca de 35 milhões de mulheres e à raça negra em geral. Vale lembrar: raça negra, você decide.

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