São Paulo, quarta-feira, 2 de outubro de 1996
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Reeleição e soberba

LUÍS NASSIF

É rematada imprudência e exorbitar da função esse envolvimento de autoridades econômicas com a reeleição presidencial.
Compromete a credibilidade do ministro Antonio Kandir essa história de prometer crescimento econômico de 9% ao ano apenas com a reeleição.
Não se trata apenas de atropelar princípios comezinhos de economia, mas normas elementares de prudência. Amarra-se toda expectativa positiva da economia ao processo de reeleição.
E se a reeleição não passa? E se passa, mas o presidente não é reeleito? Quem segura a reversão de expectativas?
Qualquer contribuição à tese da reeleição da parte das autoridades econômicas tem de se dar na construção econômica e na condução das reformas.
Se o programa de reformas se mostrar consistente, a continuidade será pedida pela própria opinião pública. Se se mostrar medroso, até se pode conseguir a emenda da reeleição, mas não se conseguirá reeleger o presidente.
Pingue-pongue
Dentro da sequência maluca que caracteriza a opinião pública brasileira, depois do inferno astral do início do ano, o governo vive período de bonança.
Reverte-se a imagem negativa no mercado internacional. Em que pese a situação ainda complicada da atividade econômica, existe um claro processo de novos investimentos e de reconstrução de mecanismos financeiros básicos.
Que não se perca novamente pelo deslumbramento. As ondas otimistas seguem-se às pessimistas, quando se percebe que o país não estava tão ruim quanto se pensava. A euforia levará, agora, a uma supervalorização de todos os pontos positivos.
Daqui a algum tempo, os formadores de opinião vão se dar conta do contrário. Que o país não está tão bom para justificar tamanho otimismo.
A questão das contas públicas não está equacionada, há uma dívida pública que sobe perigosamente, a melhoria futura da balança comercial é uma esperança -não uma convicção- e as reformas ainda não passam de promessa. Além disso, persistem a desaceleração econômica, a inadimplência e o desemprego.
Grande parte do desgaste colhido pelo governo neste ano se deveu à forma extremamente arrogante como se comportou no ano passado, quando o pêndulo da opinião pública apontava para um otimismo irreal, e o presidente e os ministros econômicos teimavam em imputar as previsões pessimistas a adeptos da fracassomania e que tais.
Incorrer no pecado de soberba, pela segunda vez, seria burrice. E nada mais soberbo do que atrelar o futuro do país a um segundo mandato presidencial.
Reforma agrária
Do ministro da Reforma Agrária, Raul Jungmann, sobre a radicalização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra no Pontal do Paranapanema:
"Fincamos o primeiro pau da barra no Pontal. Começamos a desapropriar terras. A opinião pública se convenceu da necessidade de fazer reforma agrária e pressionou o Congresso a aprovar leis que agilizam o processo.
"O que a radicalização do MST está permitindo? De um lado, a volta de grupos armados de direita, na pele da UDR. De outro, a volta de preconceitos da classe média em relação ao tema. Quais os efeitos sobre o Congresso, após as eleições, não se sabe. O que se sabe é que a radicalização vai atrapalhar bastante a reforma agrária."

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