São Paulo, domingo, 6 de outubro de 1996
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Mulher conta 'madrugada de horror'

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Na última quarta-feira, a agente de turismo Simone Brito, 30, protocolou no Conselho Regional de Medicina de São Paulo uma denúncia contra o obstetra "Antonio" e o hospital municipal Tide Setubal.
Numa longa carta de cinco páginas, ela relata a "madrugada de horror" em que se transformou o parto de sua filha, em 9 de março. Abaixo, trechos da carta e das declarações que fez à Folha:
"O médico me examinou com má vontade, foi dizendo que o bebê estava morto e me mandou calar a boca. Quando eu tirei a roupa, o médico foi falando, 'esta é viciada, tem tatuagem, cuidado.' Aí, repetiu para as ajudantes: 'Não vou nem escutar o coração desse bebê, que está morto. Avisa o pai da criança que a mulher dele está passando muito mal e que o bebê está morto.'
Eu estava apavorada. O médico virou e disse: 'Ei, você está me escutando, você entendeu o que eu disse, o seu bebê está morto, só vou abrir você para tirar.'
Fiquei na maca por uns 20 minutos, e o dr. Antonio continuava, 'que saco, esta hora da manhã ter que fazer uma cesárea'.
Quando me levaram para a sala de cirurgia, meu marido estava chorando no corredor.
Eu estava com nojo daquele monstro e com vontade de vomitar. A enfermeira disse que me daria um remédio para náusea e o médico disse, 'não gasta com esse macalé, olha a boca dela, falta dente, olha esse macalé, macalééé', ficou cantarolando.
Eram umas 8h quando o bebê nasceu, mas ele não chorava. A pediatra começou a fazer massagens, e o médico disse: 'Já morreu, não faz mal que morra, depois ela trepa de novo, essa gente só sabe trepar mesmo'. E continuou: 'Morreu aí, morreu aí?'.
Minha filha nasceu bem, uma meninona, eu me confortei um pouco. Fui levada a outra sala, de onde ouvia o dr. Antonio gritando, humilhando, chamando as pessoas de 'animal'. Fiquei encolhida no canto, com medo, até que aquele monstro foi embora.
Quando fui tomar banho no dia seguinte, a enfermeira tirou o curativo e ficou horrorizada. 'Aquele animal não podia ter feito isso', ela falou. Aí olhei no espelho e vi que o corte tinha sido na vertical, até perto do umbigo. Meu corpo estava desfigurado. A enfermeira que tirou os pontos disse que o médico usou barbante, que aquilo não se faz há mais de 30 anos.
Ainda tenho marcas de queimadura nas pernas e nas nádegas. Uma enfermeira disse ele usou bisturi elétrico sem a proteção necessária."
(AB e RSc)

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