São Paulo, domingo, 6 de outubro de 1996
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Desconhecimento, ceticismo e dor inibem queixas

AURELIANO BIANCARELLI; ROGERIO SCHLEGEL
DA REPORTAGEM LOCAL

Desconhecimento de seus direitos, ceticismo em relação à ação do CRM e sofrimento emocional são alguns dos motivos alegados pelos pacientes para não levar adiante reclamações contra médicos.
Na semana passada, Silvana Gemente, 21, perdeu um filho em dois meses de gestação um dia após ter ido reclamar de sangramento em um pronto-socorro público da capital.
"O médico me atendeu por 15 minutos, mas me mandou embora sem fazer nenhum exame. Disse para esperar. No dia seguinte, abortei", conta.
Gemente achou que não havia sido bem atendida e foi procurar a assistente social do hospital. Segundo seu relato, ela disse que não poderia fazer nada.
"Eu sei que poderia reclamar, mas já perdi a criança mesmo. O que vai adiantar agora?"
A estudante Márcia Regina Costa Barbosa, 26, caiu da escada e também procurou um pronto-socorro público. Ela diz que o médico que a atendeu apertou o tornozelo, fez caretas e "mandou tacar gesso" sem dar maiores explicações.
"Eu perguntei o que tinha acontecido, mas ele não respondeu, mesmo depois que eu insisti. Só falou que vou ficar com o gesso durante cinco dias. Acho que luxou."
Em sua opinião, não valia a pena "criar caso" por causa da falta de informação sobre seu tratamento. "Logo fica bom", disse.
Desconfiança
A guarda-civil metropolitana Vivian Farias Dutra, 25, sofreu um aborto durante o expediente. Ela estava grávida de dois meses.
Levada a uma maternidade pública para fazer curetagem, Dutra perguntou ao médico que tipo de anestesia iria tomar.
A pergunta era importante porque ela tem pressão alta, toma remédios para controlá-la e temia uma reação adversa. "A gente usa anestesia do tempo da sua avó", disse o médico, segundo relata.
"Ele caçoava de mim e ria. Não explicou nada sobre a anestesia e mandou amarrar meus braços", relembra. "Eu me soltei e falei que iria embora do hospital."
Ela conta que não pôde telefonar e teve que esperar o marido chegar, quase 20 horas depois.
Dutra tem uma coleção de histórias de descaso vividas em outros partos e consultas. Todas acabam sem reclamação formal. "Adianta reclamar ao conselho de medicina? Nessa área, um protege o outro", diz.
(AB e RSc)

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