São Paulo, sexta-feira, 11 de outubro de 1996
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Receita de civilizado

JANIO DE FREITAS

As lacunas e insuficiências da legislação que têm facilitado a sonegação de impostos, e até estimulado grande parte dela, estão sendo eliminadas por uma série de inovações legais já em últimos retoques na Receita Federal, que espera enviá-las ao Congresso na próxima semana. Como em suas iniciativas anteriores, o secretário Everardo Maciel quer as medidas adotadas por lei, e não por medida provisória.
É em relação às pessoas físicas que se observa a novidade mais original: é a novidade de que não há novidade. Pela primeira vez, nem se sabe em quantos anos, tudo o que se refira ao imposto de pessoa física permanecerá igual, no próximo ano, ao que é no atual. Já se sabem em 96, portanto, as regras para a declaração a ser feita em 98, referente a 97.
Há mesmo um vento civilizatório entrando pelas frestas da Receita, perceptível, contraditoriamente, por um erro desagradável. Foi do Serpro, o serviço de processamento, ao expedir notificações de cobrança de impostos para pagamento imediato: das 8.600 notificações, só dois terços foram dirigidas a devedores de fato. Sabe o que aconteceu? Três mil e tantos contribuintes estão recebendo cartas do secretário Everardo Maciel com pedido de desculpas. Os 300 que, mesmo sem dever, pagaram o que lhes era cobrado recebem, com as desculpas, o aviso de que a restituição já está creditada.
Entre as várias inovações que a Receita submete ao Congresso figura uma contribuição importante para o problema das tensões no campo. Por isso mesmo, deverá sofrer a oposição dos ruralistas do Congresso. Trata-se de fixar em 15% o Imposto Territorial Rural das grandes propriedades que, com mais de 5.000 hectares, têm menos de 30% da área com utilização real. Assim se acabaria sem conflito com a propriedade especulativa: ou o dono cultiva ou em cinco anos paga de imposto o equivalente ao valor presumido de suas terras.
Pela tradição brasileira, haveria uma terceira hipótese: não cultivar nem pagar. Mas, para tal caso, as medidas pensadas na Receita incluem um rito novo de execução, no qual o embargo do devedor terá que ser feito com a penhora da propriedade mesma. Só por este pormenor já se percebe o destino provável das terras.

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