São Paulo, sábado, 12 de outubro de 1996
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POETA DA DÉCADA PERDIDA

O Brasil do início da década de 80, ainda sob as regras do regime militar, que já completava duas décadas de duração, era um país que tentava reconquistar o direito à democracia e à liberdade de expressão.
Na música popular, a relativa estagnação de artistas consagrados permitiu o aparecimento de novos talentos, dessa vez sob o ritmo do rock. O grupo brasiliense Legião Urbana, tendo à frente o cantor e compositor Renato Russo, soube traduzir como poucos os anseios dos jovens da época que, nascidos durante um regime autoritário, ainda não sabiam o que era viver em uma democracia.
A morte prematura de Renato Russo remete a uma época já conhecida historicamente como a "década perdida", mas que deixou suas marcas nos rumos do país. A relativa apatia dos anos 80 -época distante do idealismo dos 60 e sem caminhos próprios definidos- atingiu diretamente a legião de jovens que queriam muito se expressar, mas não sabiam claramente o que dizer. Renato Russo tornou-se uma espécie de porta-voz dessa geração.
Os mesmos adolescentes que marchavam empolgados com a idéia de eleições diretas para presidente questionavam o futuro do país acompanhando versos de Russo, que criticava as guerras, o serviço militar obrigatório, o vestibular e a alienação da própria juventude.
Russo escreveu sonetos de difícil memorização que eram repetidos seguidamente por um público fiel. Compôs canções longas e sem refrões que fugiam do padrão de música popular exigido pela indústria fonográfica. A rebeldia estava fora de moda, mas ele decidiu ser rebelde, em uma época em que, para vencer, era preciso ser alguma coisa.
Deu aos jovens da "década perdida" a identificação que lhes faltava, o fôlego e a energia que os adolescentes sempre procuram. Foi para essa juventude um poeta, um trovador, um autor de hinos que retrataram um momento histórico brasileiro, de muita ansiedade e poucos ideais.

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