São Paulo, domingo, 13 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Dédalo de letras

RICARDO ARAÚJO
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Campo da Amérika" não pode ser lido como um livro comum. Seu tema não é o livro -ainda que o campo dos seus significantes tenha como suporte o livro; o próprio tema não pode ser reconhecido como tal; até sua catalogação como "ficção experimental" indica uma carência de orientação. Mas que espécie de livro é este, então? É semelhante ao livro que espelha todo o universo, que é referido por Dante, no último canto do "Paraíso"? Seria o livro de areia de Borges, no qual nunca há um recomeço. Seria o livro ideal de James Joyce? Um livro que não tem início, meio ou fim. Talvez, o livro de Jorge Salomão procure entre tantas fórmulas, a idéia básica que subjaz a todas essas experiências.
Por isso, o suporte de leitura "Campo da Amérika" insiste nos aforismas, nas máximas, nas repetições, no ilogicismo dadaísta, em suposições surrealistas e em ilações absurdas ou antitéticas entre o popular e o erudito.
Uma coisa é certa: "Campo da Amérika" possibilita uma leitura participativa do leitor. É como se o autor estivesse jogando palavras estruturadas em frases, para o leitor extrair dessa "selva selvaggia" sintagmática o valor isolado do significante e logo estruturá-lo em uma nova composição frásica.
Portanto estes "fragmentóticos", quase "mosaicais", que mallarmeanamente aparecem nesse "campo de experimentação", como "água de rio no seu curso indo" ("riverrun", vico-joyce) rompem "seus sentidos" em "constelação de sons", construindo um livro que "só teria título": "concreção". Quase nos termos de João Cabral: "Concreção de fatos num estômago vazio". Mas sempre vai existir o "academicismo e conservadorismo", os chatoboys, ou chatofísicos, para os quais, como dizia Mateus: não se deve "atirar pedras (sic)!"
P.S: o leitor de "Campo da Amérika" não deve esperar algo difícil, mas, também, não deve jogar todas as fichas na facilidade. O texto, na verdade, é um alucinante exercício feito por uma espécie de rábula pós-moderno, que não tem compromisso algum com a coerência, mas sim com as palavras a "palo seco": quase um sentido antes mesmo do sentido. E nunca é demais esquecer o ensinamento de Jó: "Feliz o homem que é corrigido".

Texto Anterior: Visões pós-utópicas do paraíso
Próximo Texto: Abstrato, figurativo e assim por diante
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.