São Paulo, domingo, 13 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

GLAMOUR E FATALIDADE

O lamentável episódio médico envolvendo a atriz e modelo Cláudia Liz parece, em boa parte, inscrever-se numa lógica perversa que exige das profissionais da moda uma rigorosa submissão a padrões de beleza tidos como aceitáveis no mercado. Dois centímetros a mais de busto podem exigir de uma modelo providências imediatas. Trata-se de otimizar a capacidade dos corpos para melhor promover roupas, cosméticos, jóias.
O culto ao corpo no Ocidente não é uma novidade do século 20. A valorização da ginástica na Grécia clássica respondia à necessidade de formação integral do jovem. Para o educador grego era fundamental desenvolver a capacidade de contemplação estética. O "culto" ao corpo era uma reverência à sua dimensão espiritual.
A degeneração desse culto no período helenístico e na Roma imperial produziu ápices de licenciosidade. Mas só no século 19 a Europa, sobretudo nas artes, veio a conhecer o culto do "belo pelo belo". Uma estátua de mármore não traria conteúdos sublimes. As formas do corpo já produziriam suficiente prazer estético.
A mídia e o utilitarismo mercadológico neste século parecem ter levado ao extremo o esvaziamento de sentido do corpo humano. A denúncia da chamada "corpolatria" procura flagrar duas tendências: redução da ginástica à musculação e utilização do corpo como isca para o consumo.
O acidente com Cláudia Liz pode denunciar, além de implicações relativas aos procedimentos médicos, um aspecto ainda pouco lembrado: o elevado custo da inserção das modelos no glamouroso mundo da moda.

Texto Anterior: CORRIDA CONTRA O TEMPO
Próximo Texto: O "sopão" de FHC
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.