São Paulo, segunda-feira, 14 de outubro de 1996
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O membro desequilibrado da família Brasil

JOSMAR VERILLO

Riqueza só se cria com trabalho produtivo. Trabalho por trabalho não é suficiente para melhorar a qualidade de vida. Isso porque existe muito trabalho improdutivo, aquele que não gera riqueza.
As sociedades mais ricas, capazes de realizar mais trabalho produtivo, aumentam rapidamente a quantidade e a qualidade dos bens disponíveis, o que eleva a qualidade de vida dos seus membros.
A principal marca de sociedades afluentes é a produtividade, isto é o nível de produção por habitante. A produção nesses países chega a ser dez vezes maior que a dos países menos produtivos. Com mais bens para serem distribuídos, todos os membros da sociedade se beneficiam, melhorando a qualidade de vida.
Ao contrário das sociedades ricas, as sociedades pobres se defrontam, por um lado, com falta de produção para atender a sua população e, por outro, com falta de renda para sustentar um mercado de consumo. Uma coisa está ligada à outra, como na história do ovo e da galinha.
A riqueza gerada é pouca e acaba sendo distribuída entre poucos, permanecendo a maioria da população em condições precárias e produzindo pouco.
Não por coincidência, nos países com maior produção de riqueza per capita, como regra geral, existe mais liberdade econômica, o poder público é muito menor e mais eficiente, o número e o valor pago em impostos são menores, o padrão ético, mais elevado, e o direito de propriedade, assegurado.
Nos países com baixa geração de riqueza per capita, em geral, a liberdade econômica é pouca; o poder público é maior, mais ineficiente; a carga tributária, mais elevada; a corrupção, mais presente e generalizada; o direito de propriedade, mais incerto; os contratos, pouco respeitados, tanto pelo poder público como pelos agentes econômicos.
A máquina governamental é inchada por funcionários que realizam trabalho improdutivo, da mesma forma que as empresas privadas, inchadas por funcionários que realizam tarefas para atender regulamentos, normas e caprichos da burocracia estatal, normalmente desnecessários e restritivos à atividade econômica, não criando riqueza.
Existe uma percepção enganosa de que pagar salário gera riqueza. O salário tem que ser consequência de um trabalho produtivo realizado. Pagar salário sem contrapartida de geração de riqueza é desperdício. A falsa geração de empregos se assemelha mais a programa social do que ao trabalho gerador de riqueza. A geração de riqueza só ocorre quando o trabalho contribui de forma significativa para a criação de um bem social.
A geração de emprego não está estruturalmente nas mãos das empresas, mas sim nas mãos da sociedade. Se a elite dirigente não cria o arcabouço legal onde a empresa possa operar com eficiência e segurança, os empregos produtivos não vão ser criados.
No Brasil, realizamos muitas coisas das quais não precisamos, além de pagarmos impostos em excesso, com muito pouca retribuição em serviços. Agindo dessa forma, o Brasil expulsa a geração de riqueza para outros países e fica com as instituições filantrópicas, fazendo caridade com cheques sem fundos.
Parecemos uma família onde alguns membros trabalham para ganhar a vida e outros são "gastões" perdulários, mas têm o poder de fazer as regras do jogo, como se fossem os donos da banca.
Os membros perdulários, insaciáveis nas suas necessidades de recursos, mudam a todo instante as regras do jogo, de forma a sempre levarem a melhor. Os membros que geram o dinheiro da família têm que dar cada vez maior parcela daquilo que ganham para os gastadores.
Ao longo do tempo isso abala a moral da família, que passa a atuar desorganizadamente. Alguns membros começam a se rebelar contra o status quo, principalmente quando a conta do gastador chega a valores tão elevados que coloca em risco toda a família. Eles reagem, ainda que desorganizadamente, e, dando um basta às extravagâncias do perdulário, se recusam a dar mais dinheiro sem uma contrapartida de disciplina e austeridade.
O setor produtivo precisa de recursos para investir e não pode continuar bancando o desperdício do Estado. As empresas e os cidadãos, no Brasil, transferem ao Estado quase 50% daquilo que produzem, em troca de muito pouco.
A sociedade não recebe de volta aquilo que paga. Isso equivale a uma destruição de riqueza.
Se esses recursos permanecessem nas mãos da iniciativa privada, o desemprego no Brasil seria quase inexistente e a pobreza seria muito menor.
A família Brasil precisa dar um basta ao membro perdulário.

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