São Paulo, segunda-feira, 14 de outubro de 1996
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Saxofonista James Carter racha platéia

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quando saiu do palco, fechando a noite de sexta-feira na sala New Directions, o saxofonista James Carter já tinha virado a figura mais polêmica do 11º Free Jazz.
Tocando com fúria por mais de 90 minutos, o norte-americano provocou uma cisão imediata. Boa parte da platéia exigiu o bis. Os restantes saíram antes do final -alguns irritados até, com o aparente exibicionismo do jazzista.
Esse efeito de atração ou repulsa já foi visto outras vezes na história do jazz. Músicos originais, como Charlie Parker, Eric Dolphy ou Albert Ayler (ficando somente entre saxofonistas), também provocaram polêmicas acaloradas ao surgirem no cenário do jazz.
Diferente de outros músicos da nova geração, como o talentoso Nicholas Payton, Carter não está interessado em apenas reproduzir ou embelezar formas musicais clássicas e bem-acabadas.
Seu compromisso estético é com a invenção instantânea. Como todo jazzista radical, seu objetivo maior é explorar os limites da linguagem desse gênero.
Foi o que Carter demonstrou logo ao início do concerto, num improviso de 20 minutos, baseado em "1944 Stomp", do também saxofonista Don Byas (1912-1972).
Partindo de um tema típico da estética do swing, Carter evoluiu do "bebop" ao "free", exibindo em apenas um solo o que Christian McBride tentou mostrar ao longo de todo seu show de quinta: conexão entre diferentes estilos do jazz.
Nesse exercício eclético, tudo é válido na impressionante performance de Carter. Ele grita, uiva, range, assobia e percute a palheta de seu saxofone, transformando-o em instrumento rítmico.
Até mesmo em temas mais líricos, como a balada "I Wonder Where Our Love Has Gone", Carter não faz concessões ao romantismo. Sua interpretação é seca e irônica, até mesmo sarcástica.
Ele gosta de se exibir. Em alguns momentos, estende excessivamente os solos, chegando ao limite do suportável. Mas pelo que mostra ao vivo, se resistir à vertigem do narcisismo, pode se firmar como o jazzista mais criativo de sua geração.

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