São Paulo, quarta-feira, 16 de outubro de 1996
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Política e ética

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - É cada vez maior o fosso entre a política e a ética. A tal ponto que começam a ser lançadas no debate público -e nas consciências- como elementos contraditórios. Ou se é político ou se é ético. Não se pode servir aos dois senhores.
Quando alguém invoca a ética, o mínimo que um profissional responde é que a política tem outros valores, outros fins e, sobretudo, outros métodos. Isso sem falar nos mais primários, que consideram coisa de bocó qualquer apelo à ética.
Daí que a paisagem pública é um permanente assalto ao poder, sem qualquer outro imperativo que não o poder em si. Para conquistá-lo, para mantê-lo, não apenas tudo é permitido, mas nada deve entravar o processo do poder. Ética seria coisa para filhas de Maria, débeis mentais que não entendem as coisas.
Os debates sobre a reeleição estão se tornando banais, fala-se cinicamente sobre a conveniência ou não de se reeleger FHC, como se não houvesse uma Constituição, sobre a qual juraram todos os congressistas e, em especial, o presidente da República.
Evidente que ela pode ser reformada, mas nunca para atender a um caso pessoal, a uma ambição desmedida. Os interessados no continuísmo, tirante o próprio FHC, que é apenas um sibarita do poder, argumentam que ele é o único candidato viável para impedir a ascensão de uma nova classe.
O argumento é o mesmo que manteve todas as ditaduras, de César em diante. Não vêm ao caso as qualidades do beneficiário -se as há. Um político que jura uma Constituição, que aceita se candidatar a um mandato de quatro anos, precisaria ser dotado de monstruosa insensibilidade ética para articular uma legislação em causa própria.
Se acaso FHC pedisse ao Congresso que aumentasse o seu ordenado, teria violentado um preceito moral. Articular ele próprio um mandato maior é moralmente mais condenável.

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