São Paulo, segunda-feira, 21 de outubro de 1996
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Candidatos de cabeça oca

JOSIAS DE SOUZA

São Paulo - Candidatos em campanha, como se sabe, são capazes de tudo. Vendem até a mãe, como se diz.
Mas na atual gincana eleitoral estão exagerando. Para ganhar a simpatia dos postulantes à cadeira de prefeito abdicaram até do direito de pensar.
Chegou-se à sofisticação suprema: em lugar de tentar adivinhar a vontade da massa, os candidatos instalam uma sonda direto na cabeça do eleitor.
As campanhas, antes intuitivas, evoluíram para um esquema baseado em estatísticas. Encontrou-se uma forma de penetrar as entranhas do pensamento do eleitor; um modo de captar suas vontades e angústias.
Dá-se o seguinte: atraídos por salgadinhos, refrigerantes e brindes, grupos de eleitores são reunidos em salas fechadas. Ali, avaliam vídeos de campanha, discutem propostas de governo, condenam e aprovam candidatos.
Sem que saibam, são observados por magos da publicidade eleitoral. Eles passam horas ouvindo e anotando as discussões travadas nos grupos, numa prática apelidada de "pesquisa qualitativa."
Por esse método, candidatos como Pitta e Conde afinam suas campanhas com a vontade do eleitorado. Eles recolhem as opiniões, embrulham-nas para presente e devolvem tudo ao eleitor, na forma de comerciais de rádio e TV.
Em campanhas anteriores, os candidatos entregavam aos eleitores apenas o estômago. Em suas andanças pela pefelândia, o próprio Fernando Henrique protagonizou o famoso caso da buchada de bode.
Em Pernambuco, serviu-se de alentada porção da iguaria. Provocado, comparou-a a um prato francês: "Tripe à la mode de Caen", ou simplesmente tripa à moda de Caen.
Hoje, além de café requentado e linguiça de boteco, os candidatos engolem as idéias do eleitor. Alugam a mente aos publicitários. Os mesmos que, munidos de idênticas pesquisas qualitativas, monitoram o lançamento de novos produtos no mercado de consumo.

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