São Paulo, terça-feira, 29 de outubro de 1996 |
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Indústria brasileira que só fabrica porcarias
MARILENE FELINTO
Nada mais comum do que ouvir aqui e ali alguém falando português nas ruas de East Village, Soho e na Broadway em domingo de sol e frio em Nova York, lojas abertas, todo mundo fazendo compras. Se não houver outro motivo mais forte para que não se volte de Nova York -como a miséria, o equívoco, a insatisfação com sua vida sentimental, afetiva etc.-, que não se volte, então, pelo conforto material da vida americana. É motivo suficiente. Basta sentir que o café brasileiro de Nova York é melhor do que o café brasileiro que se bebe no Brasil. E a cafeteira americana também é melhor. O microondas americano também: é três vezes melhor e mais barato do que qualquer marca da indústria brasileira. Da impressora ao liquidificador, qualquer máquina americana funciona melhor e tem vida mais longa do que os eletrodomésticos brasileiros. A qualidade do tecido -e a precisão do corte- com que se costura a calça, a camisa, o vestido e o suéter vendidos na "Old Navy" ou na "Gap" está a anos luz de distância dos molambos oferecidos ao consumidor brasileiro nas nossas C&A e Mesbla falida. Por módicos US$ 30, compra-se um vestido que vai durar a vida toda -nada dos preços extorsivos das lojas de grife nos nossos shopping centers. Brasileiro vive mal e é burro -acha que viver bem é vestir roupa de grife e usar tênis de marca. Só faz alimentar a extorsão contra si próprio. Não é à toa que cada brasileiro deixa no exterior US$ 5,14 para cada US$ 1 deixado no Brasil por cada turista estrangeiro. A classe média brasileira vem sim para Nova York vingar-se da indústria brasileira que só fabrica porcarias. Vem viver o Brasil "for export". Mas eis que estou no interior do Estado americano de Massachusetts (na cidadezinha de Hopinckinton, que não consta do mapa) quando abro o jornal "Boston Sunday Globe" e encontro, no caderno de turismo, uma matéria inteira sobre o Brasil, "The rhythm of Rio". Ou seja: uma matéria sobre o que americano acha que o Brasil é -o ritmo do Rio de Janeiro. Entre as dicas aos turistas interessados em visitar a cidade maravilhosa: "Os brasileiros demonstram suas emoções e se abraçam nas ruas. Apertos de mão são o costume entre homens e mulheres, mas as mulheres se cumprimentam com beijos aéreos nas bochechas. Os brasileiros são informais em matéria de compromissos e geralmente chegam alguns minutos atrasados." Também dizia-se algo sobre a hospitalidade da gente risonha e bronzeada. Mas nada constava da burrice do brasileiro explorado e trouxa. Melhor não voltar de Nova York. E-mail mfelinto@uol.com.br Texto Anterior: Família espera parto acampada Próximo Texto: Biografia oficial não conta tudo de Pareja Índice |
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