São Paulo, quarta-feira, 6 de novembro de 1996
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Geração Beat mostra seu legado visual

ADRIANE GRAU
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM SAN FRANCISCO

Vestindo surradas calças Levi's, bebendo bourbon sem parar e escrevendo poesias em cafés e bares, um punhado de jovens norte-americanos se tornou conhecido no início dos anos 50 como a Geração Beat. Uma das facetas pouco difundidas dessa geração está nas artes visuais. "Não é exagero afirmar que o espírito e a herança cultural do movimento beat representam um dos capítulos mais interessantes da arte na América", afirma Tim Burgar, um dos curadores da exposição "Beat Culture and the New America", que abriu as portas para o público no dia 5 de outubro no M.H. De Young Museum, em San Francisco, e segue até dezembro.
A exposição já esteve em cartaz em Nova York, organizada pelo Whitney Museum, no início do ano. Mas para a abertura em San Francisco, onde o movimento transcendeu a literatura para se enfronhar nas artes plásticas, foram adicionadas 30 obras.
Tonelada
O expoente dessa versão da mostra é sem dúvida "The Rose", de Jay DeFeo. A artista dedicou sete anos de sua vida para aplicar uma tonelada (não é força de expressão) de tinta na tela de 213 cm x 274 cm. Quando precisou remover a obra do estúdio em San Francisco, o colega e também artista Bruce Conner fez o filme "The White Rose", que está sendo exibido constantemente na exposição. "Eu passei por todo um ciclo de história da arte nessa obra: primitivo, arcaico, clássico e depois o barroco", afirmou Jay numa entrevista antes de morrer de câncer no pulmão aos 60 anos em 1989. "Todas as etapas eram interessantes e completas em si mesmas, mas não me mostravam a versão final de 'The Rose' e nem minhas intenções". A tela, que passa por um processo constante de degeneração por causa do enorme peso que o tecido mal pode sustentar, foi mantida durante vários anos por trás de um tapume numa sala de aula do San Francisco Art Institute até ser restaurada no ano passado pelo Whitney Museum.
Segundo Conner, a obsessão da colega por uma única obra foi parte da formação artística dele e de outros membros da geração. "Íamos ao estúdio da rua Fillmore e ela estava bebendo e fumando sem parar, trabalhando na única tela".
Celebração
A exposição no De Young é o ponto alto da celebração da cultura beat na cidade e inspirou 36 mostras, 70 sessões de cinema e inúmeros painéis, discussões e conferências que acontecem até 29 de dezembro.
Allen Ginsberg voou de Nova York para lançar a coletânea "Selected Poems 1947-1995" numa tarde de autógrafos na livraria City Lights, do amigo Lawrence Ferlinghetti. O livro, de 442 páginas, traz desde "Howl", que é apontado como o desencadeador da estética beat até poesias recentes.
Ferlinghetti, que completou 75 anos recentemente, também está sendo festejado. Durante o Mill Valley Film Festival foi mostrado pela primeira vez o documentário "The Coney Island of Lawrence Ferlinghetti", com direção de Christopher Felver.
Em novembro, o Museo ItaloAmericano abre as portas de "Lawrence Ferlinghetti: The Beat Poet as a Printmaker and Painter". Durante um dia dedicado à cultura italiana, haverá leituras de poesia, sessões de jazz e feira de livros no bairro North Beach, onde fica a City Lights.
As comemorações refrescam a memória sobre o primeiro movimento anti-conformista da história da arte norte-americana.
Misturando manuscritos, partituras de jazz, pinturas, esculturas, fotografias e filmes, a mostra evidencia que a geração tinha mesmo algo a dizer.

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