São Paulo, sexta-feira, 8 de novembro de 1996 |
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Inocência limita filme de Murilo Salles sobre abismo cultural no país
INÁCIO ARAUJO
O ponto de partida proposto pelo diretor Murilo Salles é animador. No Rio, dois adolescentes, Branquinha (Priscila Assum) e Japa (Silvio Guidane), invadem quase por acaso a casa do norte-americano William (Larry Pine, ótimo). Uma série de mal-entendidos transforma a inocente invasão em sequestro. Existe, no início, um problema real: as distâncias sociais que já não são apenas sociais; tornaram-se abismo cultural. Não há mais códigos sociais, linguísticos ou éticos comuns às classes. A seguir, porém, o filme perde força. Dramaticamente, a impossibilidade de se estabelecer uma comunicação entre sequestrados e sequestradores faz com que todo o interesse da trama dependa exclusivamente dos mal-entendidos. Eles se sucedem, mas a situação proposta passa a patinar na pura técnica narrativa: o que o filme tinha a dizer está dito, essencialmente, na primeira meia hora. Ao mesmo tempo, Salles postula a inocência intrínseca da infância. Parti-pris pré-freudiano que leva os protagonistas a se apequenarem aos poucos, reduzindo-se a clichês que, em vez de nos confrontarem cruelmente com a gênese da marginalidade, postulam a pureza do ato criminal. Com isso, "Como Nascem os Anjos" entra na perigosa seara da literatura cor-de-rosa aplicada a questões sociais. E este filme, no mais muito bem resolvido artesanalmente, termina chegando a um paradoxo: em vez de comunicar a idéia de inocência dos personagens, transmite a idéia de inocência do próprio filme. De Murilo Salles pode-se esperar mais. Filme: Como Nascem os Anjos Produção: Brasil, 1996 Direção: Murilo Salles Com: Priscila Assum e Silvio Guindane Quando: a partir de hoje nos cines Espaço Unibanco 1, Morumbi 6, Olido 2 Texto Anterior: "Anjos" se encantam com o morro Próximo Texto: 'Party Girl' não é o que parece sobre festas de NY Índice |
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