São Paulo, domingo, 10 de novembro de 1996
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Peritos ainda não sabem como evitar queda

MARCELO GODOY e RICARDO FELTRIN

MARCELO GODOY; RICARDO FELTRIN; ANDRÉ LOZANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Apuração não respondeu a pergunta sobre como evitar acidente igual ao do Fokker; outras dúvidas persistem

A investigação do Ministério da Aeronáutica ainda não respondeu a principal questão sobre o acidente com o Fokker-100 da TAM.
A questão é como evitar que uma pane com repetidas aberturas do reverso (freio aerodinâmico da turbina usado somente nos pousos) ocorra numa decolagem e impedir que ela derrube o avião?
Essa pane, que é a causa mais provável do acidente, pode ainda provocar outro acidente, igual ao que matou 98 pessoas no Jabaquara (zona sul), no dia 31 passado.
A última medida tomada para tentar evitá-la é checar o funcionamento do reverso antes da decolagem, o que diminui o risco. A recomendação dada quinta-feira pela Fokker Aircraft, fabricante do avião, foi seguida pela TAM.
Os peritos ainda não acabaram análises sobre o acidente, e várias perguntas estão sem resposta.
Há suspeitas de que um curto-circuito ou o rompimento de um fio tenham danificado um relé (interruptor elétrico) ligado a uma válvula hidráulica do reverso. Isso teria acionado o sistema de forma intermitente -o reverso abriu e fechou quatro vezes.
Mas os peritos não descobriram o que provocou o rompimento do fio -fadiga de alguma peça, deficiência de manutenção ou falha no projeto. Esse estudo está sendo feito por engenheiros aeronáuticos em São José dos Campos (SP).
Reconstituição
Na Holanda, um outro grupo de peritos tenta resolver uma terceira dúvida: o piloto José Antônio Moreno podia evitar a queda nos 18 segundos que teve para agir desde a primeira abertura do reverso?
A resposta deve ser dada pela reconstituição do acidente nos simuladores de vôo da Fokker. Os testes acabam no fim-de-semana.
O treinamento dos pilotos de Fokker prevê a abertura de reverso numa decolagem, mas nunca foi simulada uma pane com aberturas repetidas porque não era previsto que isso pudesse acontecer.
"Posso garantir que essa pane não era conhecida por nenhum instrutor ou piloto de Fokker-100", diz o comandante Mário Gnecco, piloto da TAM.
Ele diz que, nas decolagens, as alavancas que acionam o reverso ficam travadas. "Não imagino o que possa ter acontecido."
Nem a Aeronáutica. "O mais importante é saber o que fazer para evitar que outro avião caia", diz o coronel-aviador Douglas Ferreira Machado, diretor do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticas).
É importante lembrar que o reverso é um equipamento auxiliar e não-obrigatório. "É como uma carta na manga do piloto", afirma Helio Ruben, diretor do Sindicato Nacional dos Aeronautas.
18 segundos
Durante os 18 segundos que separaram a primeira abertura do reverso da queda do avião, o Fokker-100 perdeu potência na turbina direita quatro vezes.
A investigação não respondeu se o piloto sabia que o problema era o reverso. Moreno pode ter morrido sem perceber qual era a pane.
Os peritos também estudam a possibilidade de o jato ter decolado em Congonhas acusando uma pane no sistema automático de aceleração: o autothrottle.
Quando acontece essa pane, que é comum, o piloto desliga o sistema de aceleração automática e passa à manual. Moreno teria desligado esse dispositivo, pois a falta dele não impede a decolagem.
No entanto, a aeronave não respondeu à sua expectativa: ela continuou perdendo potência. Como o reverso fechou e destravou outras vezes, o avião perdeu velocidade -o Fokker chegou a 288 km/h e a 33 metros de altitude.
Por fim, os peritos não responderam se o avião tinha velocidade suficiente para continuar a decolagem caso o piloto desligasse a turbina com defeito -procedimento de emergência para enfrentar uma abertura de reverso na decolagem.
"Nenhum piloto que eu treinei conseguia controlar o avião quando simulávamos uma abertura de reverso na decolagem. Isso só acontecia após a terceira simulação", disse o comandante José Seabra, diretor de segurança do sindicato dos aeronautas.
Nesta semana, a comissão que apura o acidente concluirá o relatório preliminar da tragédia. Ele indicará as possíveis conclusões do relatório final da Aeronáutica.

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