São Paulo, domingo, 10 de novembro de 1996
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Meia Neto vai irradiar força aos companheiros

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

É um jogo duro para o Corinthians, lá em Recife. Mas o Sport, depois de brilhar durante um certo tempo no certame, parece estar na descendente.
Já o Corinthians, desde o início tocado aos trambolhões pela incúria de sua diretoria, reaprumou-se a partir da chegada de Nelsinho. Conseguiu varar a pior turbulência, jogou ao mar a carga desnecessária e agora começa a vislumbrar um horizonte mais azulado.
Mais do que isso: com a presença de Neto e a expectativa da volta breve de Marcelinho, começa a sonhar com vôos mais altos. É bem verdade que Marcelinho ainda levará tempo para recuperar sua melhor forma, assim como Neto é uma incógnita.
A última imagem que tenho de Neto compõe uma cena dolorosa: no Campeonato Paulista, com a camisa do Araçatuba, parado na intermediária inimiga, gesticulando, bradando com os companheiros, sem ao menos conseguir tocar na bola, sua velha e mansa companheira.
Mas futebol, para mim, é mais ou menos como álbum de figurinhas: são retratos estáticos, nos dois sentidos -lá estão congelados rostos que produzem inexplicáveis vibrações.
É assim que prevejo Neto em campo: tolhido pelo peso de seu desprezo atávico por seu próprio talhe, mas irradiando força aos companheiros e medo aos adversários.
*
No Parque Antarctica, há três bustos velando pelas glórias eternas do Palmeiras. Ademir da Guia representa a era das Academias, das quais foi o mais sólido e requintado pilar. Junqueira é um tributo ao heróico pioneirismo do Palestra de Heitor, Romeu e a memorável linha média que o povo batizou de Sissi, Gasosa e Guaraná.
Entre ambos, Waldemar Fiúme, que nesta semana nos deixou apenas sua lembrança.
Em campo, era como se mãos sábias tivessem trocado o pincel de Modigliani por um cinzel. E lá está desfilando sua elegância de gestos e temperamento, um sujeito espigado, o corpo se estendendo além das pernas, o pescoço alongando-se até se confundir com a cabeça, sempre serena, com os lábios selados.
Nisso, Fiúme, Ademir e Junqueira tinham muito em comum: as palavras contidas. E, se um traço épico unia mais Fiúme a Junqueira, ambos capazes de se atirarem aos pés do inimigo para evitar um gol, com Ademir ele se fundia no porte, na cadência e na fineza do trato com a bola. Tanto que era por aqui chamado de "O Professor" ou "Pai da Bola".
Típica cria da casa, a exemplo de Oberdã, Lima -o "Garoto de Ouro"- e Canhotinho, Fiúme reinou no Parque durante quase duas décadas, dos anos 40 às beiradas dos 60, quando encerrou sua carreira no Bragantino.
Começou como meia-direita, para logo recuar à linha média, onde exibia sua classe indistintamente nas três posições.
Ali teve parceiros ilustres, como Og Moreira, Gengo, Túlio, mas foi com o argentino Luís Villa e o paulistano Dema, "O Carrapato", que constituiu um dos dois mais célebres trios intermediários da história alviverde. Nunca jogou na seleção brasileira. Nunca reclamou disso. O Palmeiras lhe bastava.

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