São Paulo, segunda-feira, 11 de novembro de 1996
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Pouco se salva em "O Guarani"

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

"O Guarani" é um problema nacional. É um mito fundador do Brasil como nação miscigenada. Mas pode, conforme o momento ou o ponto de vista, parecer uma vasta patuscada em torno do índio que se apaixona pela clara Ceci.
Obviamente, o filme de Norma Bengell aspira ao primeiro sentido, o que não é nada absurdo. Com o fim dos governos militares e do marxismo, é viável pensar uma refundação do país e, portanto, desse mito que envolve brancos, índios, natureza, sol, pureza, traição, grandeza, miséria.
As primeiras imagens, ternas, numa floresta que mais parece um ventre materno, levam a pensar no melhor. Logo, porém, um campo/contracampo entre Ceci e Isabel põe o espectador de sobreaviso: como é possível uma descontinuidade de interpretação tão completa entre duas atrizes?
Logo depois, outro sobressalto: passamos de um Brasil mitológico, mas razoavelmente coerente, para o reduto dos mercenários que servem ao pai de Ceci.
O que vem a seguir não é muito mais animador. Compreende-se mal certos planos-sequência, como aquele em que o vilão Loredano dialoga com outros insurretos sem que se veja os insurretos.
Compreende-se ainda menos a ação. Para ficar num exemplo, dom Álvaro recebe uma flechada no ombro. Minutos depois ressurge, todo pimpão, em plena atividade bélica. Tempos depois, seu corpo é carregado por Peri, devidamente morto. Não são elipses: são problemas narrativos até estranhos. Deixam a impressão de que faltou negativo, ou que o ator foi embora no meio da filmagem.
"O Guarani" corre o risco de transmitir ao jovem espectador -aparentemente, seu público-alvo-, a impressão de um mito mais afundador do que fundador.
Fazem sentido, no entanto, a música de Wagner Tiso e a interpretação de Márcio Garcia como Peri. Só pelo tanto de gente que ele carrega, merecia cachê extra.

Filme: O Guarani
Direção: Norma Bengell
Com: Márcio Garcia e Tatiana Issa
Lançamento: Europa (011/7295-7020)

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