São Paulo, quarta-feira, 20 de novembro de 1996
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FIDEL, FIEL?

A visita do ditador cubano Fidel Castro ao papa é mais um exemplo de mito da Guerra Fria que morre. Afinal, o comunismo sempre foi anticlerical, e muitos pagaram com a própria vida pela coragem de manter a fé sob o jugo de regimes comunistas ao longo do século 20.
E a Igreja Católica, além de ter em muitas ocasiões se aliado a forças anticomunistas, foi também uma espécie de concorrente político, no plano das organizações laicas, envergando bandeiras sociais muitas vezes até com um teor revolucionário.
Mas hoje o contexto é totalmente outro. Inimigos e concorrentes, contrários que no passado tiveram pontos de contato, o comunista Fidel e o papa agora se encontram para introduzir mais uma peça na complicada colcha de retalhos em que se converteu a política internacional depois da queda do Muro de Berlim e da dissolução da União Soviética.
É importante notar que o próprio João Paulo 2º teve um papel decisivo na derrocada final dos regimes comunistas do Leste Europeu, principalmente o polonês. Tem assumido, nos últimos anos, um discurso de conotações éticas contra a desumanização do capitalismo.
Mas a visita de Fidel ao papa insere-se num tabuleiro mais amplo do qual participa a União Européia. Trata-se da reação organizada contra a Lei Helms-Burton, que endurece o bloqueio econômico a Cuba. Os países europeus nem sempre sintonizaram sua diplomacia econômica com os interesses políticos de Washington, sobretudo na Ásia e no Oriente Médio e, agora, na América Latina.
Do ponto de vista cubano, a "abertura" econômica à qual se dedica agora Fidel é sem dúvida fruto de circunstâncias que beiram o colapso. Sem poder contar com a ajuda externa que, propiciada pela União Soviética, sustentou por décadas a ditadura comunista, Fidel agora mostra-se disposto a negociar com seus antigos inimigos, principalmente se não forem norte-americanos. Resta saber até onde poderão chegar, em termos de concessões políticas, as suas novas promessas de fidelidade.

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