São Paulo, sexta-feira, 22 de novembro de 1996 |
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"Manneken Pis" traz lirismo quase doentio
JOSÉ GERALDO COUTO
Essa é apenas uma das muitas originalidades dessa surpreendente história de amor, premiada na Semana da Crítica em Cannes-95. Narrado linearmente, o enredo do filme seria o seguinte: aos 12 anos, o garoto Harry vê a família toda, dentro do carro, ser esmagada por um trem, enquanto ele faz xixi na beira da estrada. Depois de passar 16 anos num orfanato, ele vai a Bruxelas procurar trabalho. Emprega-se como ajudante de cozinha de um restaurante e apaixona-se por Jeanne (Antje De Boeck), condutora de bonde. Mas o romance é desencontrado e difícil, principalmente porque Harry (Frank Vercruyssen) tem um trauma: a última frase que disse a sua mãe, antes do desastre fatal, foi "eu te amo". Por conta disso, o rapaz acredita que essa oração pode causar a desgraça de quem a diz e de quem a ouve. Se fosse um filme realista vulgar, tudo se resumiria a um caso patológico que o amor e a dedicação da mocinha resolveriam, no final feliz. Mas nada é vulgar nesse filme -e fica em aberto a possibilidade de as palavras terem de fato um poder mágico e nefasto. Em vez do sentimentalismo banal de Hollywood, há aqui uma percepção lírica, febril, quase doentia, do afeto e suas arestas. A narrativa entrecortada e elíptica, a interpretação crispada dos jovens atores, os longos silêncios, a ênfase nas cores frias e a atenção aos objetos inanimados traduzem em belo cinema esse lirismo. Numa cena inesquecível, o chão de uma sacada no sétimo andar cede sob os pés de Jeanne, depois de Harry ter-lhe dito a frase fatídica. Se a fé move montanhas, o amor demole edifícios. Filme: Manneken Pis Produção: Bélgica, 1995 Direção: Frank Van Passel Com: Frank Vercruyssen, Antje De Boeck Quando: a partir de hoje, nos cines Metro e Gemini Texto Anterior: Diretor perdeu o tom Próximo Texto: "Chocolate" aproxima desigualdades Índice |
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