São Paulo, segunda-feira, 25 de novembro de 1996
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Por que culpar a Indonésia?

ADIAN SILALAHI

Pode parecer estranho, mas, aos olhos de muitos europeus, o Brasil e a Indonésia compartilham um legado colonial português. Essa é a única conclusão a que se pode chegar depois de ler as acaloradas notícias da imprensa do Hemisfério Norte que culpam a Indonésia pela tragédia de Timor Leste.
Esse debate internacional injustamente reduz nossa sociedade de 200 milhões de pessoas e assuntos complexos, que evoluíram durante centenas de anos, a estereótipos simplistas e declarações de 30 segundos na televisão.
Nossa mensagem às pessoas de mente aberta em todo o globo é simples: procurem enxergar além das manchetes e explorem a história dinâmica do crescimento econômico da Indonésia e o pleno contexto do nosso sistema político, que governa um país diverso, composto de 17 mil ilhas e 300 grupos étnicos -uma diversidade que celebramos, mas que torna a união e a estabilidade muito preciosas para nós.
Manchetes recentes desconsideram completamente os quatro séculos de negligência colonial portuguesa em Timor Leste e a eventual e sangrenta guerra civil detonada pelo abandono abrupto e irresponsável da colônia por Lisboa em 1975. Doença, fome e morte foram os legados infelizes que os colonizadores portugueses deixaram atrás de si. Tais notícias também não refletem o fato pertinente de que o povo timorense do leste exerceu seu direito de autodeterminação em 31 de maio de 76.
É realmente irônico que, cerca de 20 anos depois, um pequeno grupo de timorenses do leste que vive no exílio esteja "advogando" a autodeterminação do povo timorense do leste por meio de um referendo, enquanto os fatos demonstram que esse mesmo grupo foi quem abortou o processo de descolonização levado a efeito pelas autoridades coloniais portuguesas com a cooperação da Indonésia, o que levou à eclosão da guerra civil.
De fato, os últimos 20 anos proporcionaram a Timor Leste mais progresso do que os últimos quatro séculos somados. Os esforços conjuntos do povo do Timor Leste e dos governos central e local levaram a um índice anual de crescimento econômico de 10% -muito mais alto do que o crescimento de 6,8% de outras províncias indonésias. Além do mais, a renda "per capita" do Timor Leste octuplicou desde a partida dos portugueses.
Acima disso, a assistência econômica e as melhorias na infra-estrutura do Timor Leste demonstram o contínuo compromisso da Indonésia em combater a pobreza e o subdesenvolvimento que caracterizaram o domínio de Portugal. Na época da integração do Timor Leste com a Indonésia, em 1975, mais de 90% dos habitantes da ilha eram analfabetos, muitos estavam isolados em aldeias remotas, sem estradas ou meios para comunicar-se com o mundo exterior, e a agricultura era do mais primitivo grau de subsistência. Em resumo, a maior parte do século 20 passou por cima do Timor Leste.
A Indonésia destina seis vezes mais recursos para o Timor Leste, em base "per capita", do que a qualquer outra de suas províncias. Neste ano, o Timor Leste receberá recursos do governo indonesiano no valor de US$ 60 milhões só para projetos de desenvolvimento. Isso representa quase 35 vezes a média anual de gastos para o desenvolvimento do Timor Leste durante os anos finais do domínio português.
Nossos esforços para promover a diversidade cultural e a liberdade fizeram crescer oito vezes o número de novas igrejas no Timor Leste e aumentar a porcentagem de católicos de mais de 26% em 1974 para 92% atualmente. O número de escolas também subiu de 50 para mais de 800 hoje, incluindo, pela primeira vez, 4 faculdades. Hospitais e centros de saúde passaram de 2 e 14, respectivamente, em 1974, para mais de 11 hospitais e 330 postos em toda a província, atualmente.
De fato, a economia do Timor Leste figura entre as economias indonésias que crescem mais rapidamente. Para manter essas conquistas, é importante que, em vez de fazer campanha contra a Indonésia e contra o desejo da vasta maioria do povo timorense do leste, que escolheu seu destino optando pela integração com a Indonésia, esse mesmo grupo de timorenses do leste no exílio adote uma postura realista e positiva e contribua para os esforços de desenvolvimento que estão em curso no Timor Leste. As campanhas e os atos de provocação contra o povo timorense do leste, feitos por esse grupo exilado, vão apenas prejudicar os interesses e o bem-estar do povo da província, que está desfrutando de um raro período de paz e estabilidade, depois de 450 anos de abuso por Portugal.

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