São Paulo, sexta-feira, 29 de novembro de 1996 |
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Buscemi retoma fórmula de independentes
INÁCIO ARAUJO
Ok, há outras diferenças, elas são inúmeras. Mas, no essencial, essas duas vertentes da produção norte-americana parecem, cada dia mais, repousar igualmente sobre convenções. Ver "Ponto de Encontro", de Steve Buscemi, é um pouco como ver recente "Cortina de Fumaça". Há um lugar, histórias que se cruzam, as pessoas comuns colhidas em seu cotidiano, personagens encontrados quase ao acaso. É também, em parte, como revisitar o cinema de John Cassavetes: idealismo "vivo", narrativa voluntariamente errante, diálogos cheios de digressões, interpretações espontâneas etc. A diferença é que o cinema de Cassavetes era seminal, trazia efetivamente algo de novo. Seus discípulos, como Steve Buscemi, nem tanto. Em resumidas contas, o cassavetismo atual mimetiza Cassavetes, quando a alma dos filmes de Cassavetes consistia em negar o mimetismo. Assim, é um pouco difícil analisar "Ponto de Encontro". É uma história de pessoas que se encontram e passam o dia bebendo, num determinado bar. Ou de homens trustrados, que nunca conseguiram realizar seus sonhos. A começar por Tommy, o personagem central, interpretado pelo próprio diretor-roteirista. Alguém que sonhou ser artista, mas se tornou mecânico de automóveis e sorveteiro (segundo Buscemi, o personagem é baseado no que ele supõe que seria sua vida, caso não tivesse ido para Nova York e insistido na carreira de ator). Ou de mulheres infelizes, porque casaram com homens frustrados. Ou ainda de seres absolutamente boçais, que não conseguem chegar a um acordo sobre nada, exceto a marca da cerveja que vão tomar. À custa de empilhar situações circunstanciais, o filme de Steve Buscemi torna-se enfadonho: Tommy bebe, Tommy perde a noiva, Tommy perde o emprego, Tommy paquera. Enfim, joga sua vida pelo esgoto. Tudo é tão mais aborrecido porque nada tem de desonesto. E porque -sendo ambientado em um subúrbio distante (e não em Nova York, como de costume) e não contendo violência ou "fuck you" em excesso- ameaça propor uma alternativa ao "independentismo", mas não chega a nada. Buscemi limita-se à fórmula: os seres vivos, os momentos não necessariamente dramáticos, os diálogos colhidos aparentemente ao acaso. Também não falta o tipo característico, como o sujeito que só bebe, quase não fala e é depositário de uma espécie de saber etílico. O repertório independente parece se esgotar com a mesma rapidez com que seus filmes agregam nomes de atores famosos. Produção: EUA, 1996 Direção: Steve Buscemi Com: Steve Buscemi e Chloe Sevigny Quando: a partir de hoje nos cines Bristol, Olido 3 e circuito Texto Anterior: 'O Amor' promove a bagunça dos sexos Próximo Texto: "O Prazer de Matar" estabelece competição pela violência Índice |
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