São Paulo, sexta-feira, 29 de novembro de 1996
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COM TIRANIA, PAZ É GUERRA

Diz-se que a política é a continuação da guerra por meios pacíficos. Mas, quando a paz não se completa com uma democratização plena, as bases da política se estreitam, e os riscos de uma guerra aberta aumentam. Essa é a situação atual nos países que compõem a ex-Iugoslávia.
O Ocidente ajudou a pacificar a região, mas tem estado ausente no processo de democratização. É uma decisão natural. Afinal, a guerra acabou, e as bárbaras tentativas de "limpeza étnica" parecem coisa do passado. Não haveria a rigor razões para que potências estrangeiras interviessem em assuntos internos.
As manifestações da oposição na atual Iugoslávia (Sérvia e Montenegro) nos últimos dez dias, entretanto, colocando dezenas de milhares de manifestantes nas ruas, revelam uma situação doméstica que se aproxima da tirania. O governo de Slobodan Milosevic armou uma operação de fraude eleitoral que parece evidente, anulando resultados de eleições municipais em que foi derrotado.
Estima-se em cem mil os manifestantes que estiveram nas ruas de Belgrado, onde pela primeira vez desde o fim do comunismo a oposição foi vitoriosa. Há notícias de censura à imprensa, e o governo força um resultado que lhe seja favorável, procedendo a novos escrutínios, enquanto a oposição parte para o boicote.
A tensão é crescente, e a paz, cada vez mais aparente. Há menos de um ano chegou-se a um acordo de pacificação na Bósnia, mas eleições em qualquer uma das repúblicas da ex-Iugoslávia seriam testes decisivos. A atual Iugoslávia não está passando no teste, e as consequências são imprevisíveis.
A região é hoje um dos palcos mais dramáticos entre os vários conflitos de ordem regional que surgiram após o final da Guerra Fria.
Depois da ruptura do bloco comunista, conflitos étnicos reprimidos voltaram à superfície como se os rancores tivessem surgido ontem. Numa conjuntura de democratização precária, a fronteira entre paz e guerra torna-se mais tênue, podendo ser rompida por qualquer provocação.

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