São Paulo, segunda-feira, 2 de dezembro de 1996
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TECNOLOGIA E RISCO

O caderno Mais! de ontem abordou a sofisticação de técnicas que permitem diagnosticar anomalias genéticas em fetos. As expressivas conquistas nesse campo ressaltam mais uma vez a necessidade de rever a atual legislação sobre o aborto, tendo em vista sua flexibilização.
O Código Penal permite a interrupção da gravidez apenas em dois casos: quando a gestante corre risco de vida e quando a gravidez é decorrente de um estupro. Já existe no país jurisprudência que oferece alguma abertura para a prática do aborto quando se constata anomalia grave no feto. A autorização judicial pode ser obtida mediante a apresentação de laudos de três médicos (exceto daquele que já acompanha a gestante) e de um psicólogo ou psiquiatra.
Entretanto, no Brasil uma jurisprudência não é fonte de direito. Não garante, dessa forma, que futuras decisões para casos similares caminhem no mesmo sentido.
Uma mudança na lei do aborto ofereceria aos pais maior autonomia para decidir se desejam ou não arcar com o ônus de cuidar de uma grave deficiência do nascituro (muitas vezes pelo resto da vida).
Não se pode, aliás, ignorar uma agravante no caso brasileiro. O mesmo Estado que hoje mantém uma lei draconiana para o aborto vem mostrando total incapacidade de oferecer à população um sistema de saúde pública eficiente.
Existem, é claro, dificuldades para definir inequivocamente o que são anomalias graves, bem como questões éticas no avanço irrestrito de técnicas de diagnóstico que permitem testar a "qualidade genética" de fetos. Mas essas objeções não podem constituir obstáculo à necessidade de garantir aos pais o máximo de autonomia para tomar uma decisão de tão grande importância.

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