São Paulo, quinta-feira, 5 de dezembro de 1996
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A estrela de Caim

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - O PT considera-se um partido diferente dos demais. De fato, é. Mas já não pode orgulhar-se disso.
O habitual, nos partidos brasileiros, é o poder funcionar como cola aglutinadora de personalidades muitas vezes incompatíveis. Seja (em raros casos, aliás) pelo desejo de realizar o projeto em nome do qual se chegou ao poder, objetivo maior que faz com que se varram as divergências para baixo do tapete. Seja, no mais das vezes, porque o poder atende conveniências pessoais ou eleitorais.
O PMDB é um caso exemplar: tornou-se uma gigantesca máquina a partir de 1982, momento em que começa a se transformar em alternativa de poder em todos os planos. Mesmo com sucessivos rachas internos, alterna-se até hoje com o PFL na condição de maior partido brasileiro.
O PT, não. Consegue fazer com que o poder, em vez de aglutinar, dissolva o partido, lenta, mas inexoravelmente. O conflito entre o governador Vitor Buaiz e correntes internas petistas no Espírito Santo chega a ser "surrealista", definição, aliás, usada pelo próprio governador, um dos dois únicos que o PT conseguiu eleger até hoje (o outro é Christovam Buarque, do DF).
O PT parece não permitir-se briguinhas domésticas que terminam com escoriações, ainda que generalizadas, seguidas de alguma acomodação. Não. Suas disputas são bíblicas, coisa de Caim e Abel. Só podem terminar com a morte do oponente ou, no mínimo, com a sua expulsão do paraíso, no caso a legenda da estrela vermelha.
De fora, divisa-se mal até qual é a razão de fundo do conflito. De novo, parece coisa religiosa, de seita, de mandamentos mais ou menos obscuros cuja interpretação cada corrente considera patrimônio exclusivo seu.
Bem feitas as contas, o PT nem precisava que o Muro de Berlim tivesse caído na cabeça de todas as esquerdas, no Brasil e no resto do mundo, aturdindo-as e enfraquecendo-as.
Ele próprio se incumbiria de destruir-se.

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