São Paulo, sábado, 7 de dezembro de 1996
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Operadores do direito

WALTER CENEVIVA

A vida dos operadores do direito (advogados, promotores, delegados de polícia, juízes, notários, registradores, entre outros) anda muito complicada neste final de século. Leis confusas, excessivas e até contraditórias, instabilidade jurídica, insuficiente e mal organizado aparelhamento do Estado transformam sua atividade profissional em fonte perene de incerteza e de insegurança, agravada esta pela desconfiança do povo na Justiça oficial, afastada da estima e do respeito de sua clientela. Os operadores, públicos e privados, são afogados por torrentes de novidades mutantes, sociais, políticas, econômicas, individuais e coletivas, nacionais e transnacionais.
A veloz transformação da vida, em nível mundial, sem precedente em toda a história do homem, sobretudo pela quantificação geométrica dos processos e pela imediata notícia que chega a todos os cantos do mundo, quase no mesmo instante em que os fatos se produzem, mudou o ritmo dos trabalhadores jurídicos. É constrangedor verificar que muitos, dentre eles, ainda não viram o lampejar das luzes vermelhas de advertência, a respeito dos perigos decorrentes de sua omissão no enfrentamento da tarefa de adequar o aparelho da Justiça ao rápido crescimento de seus "consumidores".
O povo vê os fatos, sob a interpretação raramente correta dos comunicadores, e inclui todos os operadores jurídicos no mesmo saco do elitismo, da linguagem incompreensível, na preferência pelas acrobacias processuais, em detrimento da sorte do justo. A massa da informação oferecida à sociedade fora do contexto da lei e do processo surge geralmente fora da adequada relação destes com o fato concreto. A sociedade a recebe sem meios de reflexão que componham os valores envolvidos, éticos, sociais, econômicos e políticos, em cada passo da prática da Justiça oficial.
As idéias que o leitor acompanhou até aqui foram enunciadas por mim, em discurso proferido no Instituto dos Advogados de São Paulo, quando, por iniciativa de seu presidente, Cláudio Antonio Mesquita Pereira, foi-me outorgado o honoroso título de sócio emérito. Ponderei, então, que os trabalhadores da área jurídica têm fraquezas comuns. É o caso, por exemplo, do mau ensino jurídico, com a falta de cultura geral, o despreparo técnico, trazendo a reboque a inconsciência profissional.
A curto prazo não há luz no fim do túnel, mas as más consequências serão contornáveis se os operadores do direito compreenderem a conveniência de sua união para o enfrentamento das grandes teses. A tripartição dos poderes deve ser repensada. Estamos precisando de outro Montesquieu no caminho de uma nova Ágora, na qual todos os cidadãos possam manifestar-se sobre os destinos da cidade. A Internet nos mostra que isso será tecnicamente possível em breve prazo.
A unidade não dispensa o tratamento livre das discórdias entre os operadores. Súmula vinculante, controle externo, limites da atuação do Ministério Público, quinto constitucional, liberdade opinativa dos advogados. Esses e outros temas devem ser discutidos. Mas será boa para quem trabalhe na Justiça, servidor público e ente privado, a preservação dos valores comuns, essenciais a todos, em conjunto, sendo igualmente responsáveis por eles, a benefício do "consumidor" final, que é o povo.

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