São Paulo, domingo, 15 de dezembro de 1996
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Pecados capitais

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Em 1964, a Editora Civilização Brasileira lançou uma coletânea de contos sobre os pecados capitais. Reuniu seis cobras e um frustrado aprendiz de primeiras letras para o trabalho, que foi lançado com sucesso tal e tanto que imediatamente veio outra coletânea sobre os dez mandamentos. Nove cobras foram então reunidos e o aprendiz de primeiras letras também compareceu -nada é perfeito.
Os seis cobras de "Os Sete Pecados Capitais" foram Guimarães Rosa, Otto Lara Resende, Guilherme Figueiredo, Lygia Fagundes Telles, Mário Donato, José Condé. O aprendiz que até hoje não conseguiu aprender nada era eu mesmo.
Rosa ficou com a soberba -e ficou bem. Otto ficou com a avareza -pecado que com ou sem razão é atribuído aos mineiros. Mário Donato, que andava perseguido naquele tempo, gostou de ter ficado com a ira. José Condé, um sujeito puro, precisou se violentar para escrever sobre a inveja. Especialista em comes e bebes, Guilherme ficou com a gula. Lygia -a doce Lygia- fez um belíssimo conto sobre a preguiça.
Evidente que a sacanagem coube ao aprendiz. Fiquei com a luxúria. "Grandeza e decadência de um caçador de rolinhas" foi o título daquilo que seria o meu primeiro e quase último conto.
Uma outra editora anuncia que lançará agora, com os mesmos temas, mas com diferentes autores, uma coletânea de contos sob o mesmo título. Não vejo nenhum plágio na idéia. O cinema francês fez dois filmes com episódios assim, mudando apenas os diretores, o primeiro com gente da velha guarda, o segundo com o pessoal da "nouvelle vague".
O José Salomão, da Civilização, já está fazendo os contactos necessários para relançar o livro de 64. É uma boa idéia para movimentar o setor literário. Ganharia o leitor e até a própria literatura -desde que todos evitassem o caçador de rolinhas com a sua inexistente grandeza e sua óbvia decadência.

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