São Paulo, quinta-feira, 19 de dezembro de 1996
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Quem ganhou com a CRT

CELSO PINTO

O ágio recorde de 54,8% sobre o preço mínimo alcançado na venda de 35% das ações ordinárias da Companhia Riograndense de Telecomunicações (CRT) criou uma enorme excitação e algumas dúvidas no mercado.
Afinal, foi a CRT que custou caro demais ou são as outras teles que estão muito baratas? Foi o melhor negócio possível para o governo gaúcho?
Não há dúvida que os preços das teles em Bolsa estão subvalorizados, não só comparados ao preço da CRT, mas também aos de outras telefônicas na América Latina. Mais complicado é saber se a CRT custou caro demais.
Muita gente, inclusive alguns consórcios que disputavam a CRT, achavam o preço mínimo de R$ 440 milhões muito caro. O consórcio vencedor (Telefónica Internacional de España, RBS e Citicorp), contudo, acabou pagando R$ 681 milhões e, como prova que sua avaliação não foi inteiramente insana, o outro consórcio ofereceu R$ 677 milhões.
Olhando a seco, o preço parece extraordinário, já que o lote de 35% de ações ordinárias ainda deixa o controle nas mãos do governo gaúcho (50,4% do capital votante) e equivale a apenas 13,4% do capital total da CRT. Essa conta, contudo, é enganosa.
Em primeiro lugar, porque um acordo de acionistas, válido por cinco anos e renovável, dará ao consórcio vencedor 3 postos-chave dos 6 na diretoria executiva da CRT.
A empresa terá que cumprir à risca um plano de metas abrangente, mas, supondo que isso ocorra, o parceiro privado terá direito a 1% da receita líquida da CRT como prêmio. Calculando esse prêmio pelos próximos dez anos, pelo seu valor presente, ele vale cerca de R$ 110 milhões. Ou seja, ele reduz o preço de compra de R$ 681 milhões para R$ 571 milhões.
Mais importante, contudo, são os valores estratégicos embutidos na compra. O governador Antônio Brito diz que só não vendeu o controle total da CRT porque o governo (leia-se, o ministro Sérgio Motta) só agora enviou a lei regulamentando a abertura na telecomunicação. Sem a aprovação dessa lei seria impossível privatizar.
Com a lei aprovada nos próximos meses, a CRT deverá ser privatizada e o sócio privado da CRT estará numa posição mais do que privilegiada: dificilmente alguém vai se arriscar a comprar o controle sem se acertar com ele. Portanto, no preço pelos 35%, ficou embutido parte do prêmio de controle.
Conforme as condições da privatização futura, portanto, o governo gaúcho pode ter feito um ótimo negócio a curto prazo, pelo ágio obtido pelos 35% das ações, mas um negócio menos interessante a médio prazo, se vender os 50,4% restantes com um ágio menor.
A CRT opera como monopólio num mercado maior do que o Chile e menos servido por telefones. Tudo isso vale um extra para o comprador, se a aposta numa privatização rápida e favorável a ele se concretizar.
Para a Rede Brasil Sul, que deverá ficar com 34% do controle do consórcio, o valor estratégico é enorme. O grupo já controla o maior jornal do Estado, a maior rede de rádio, a maior TV aberta e a cabo e o maior provedor da Internet. Ter o controle da telefônica lhe dá uma vantagem extraordinária, mesmo considerando que a regulação do setor imponha alguns limites. Para o governo gaúcho, por sua vez, ter um grupo com tanta força como sócio minoritário na CRT não é mau negócio político.
A Telefónica de España (e subsidiárias), que deverá controlar o consórcio, por sua vez, já opera na Argentina e poderá integrar suas operações no Mercosul.
Sabe-se que o consórcio calcula que terá um retorno anual em torno de 11% sobre o investimento, bem menor do que os 15%, no mínimo, que normalmente são embutidos no preço de compra em investimentos desse tipo. Confirma-se, portanto, que o grupo aceitou pagar um extra razoável pelo valor estratégico do negócio.
Os Bancos Icatu, Pactual e CS First Boston compararam o preço das ações da CRT com os da Telebrás e outras teles. Os critérios diferem muito, mas a conclusão é a mesma: as ações da CRT custaram algo entre 60% e 200% mais do que o valor das ações das outras teles. Mesmo descontando o prêmio na CRT, isso indica que há um enorme potencial de valorização nas ações da Telebrás e outras teles. Os três bancos apostam nisso.

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