São Paulo, domingo, 22 de dezembro de 1996
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O desafio do emprego

LUCIANO COUTINHO

A última PNAD informa que a População Economicamente Ativa (PEA) brasileira alcançou 74,1 milhões de pessoas em setembro de 1995. Hoje seriam 75,7 milhões. Dada a base etária ainda jovem de nossa população, mais de 1,6 milhão de pessoas ingressam no mercado de trabalho a cada ano, num contexto difícil em que as oportunidades de emprego-ocupação se tornam escassas, pois:
1) por causa da abertura econômica, as empresas são obrigadas a fechar linhas de produção, cortar pessoal e custos, importar insumos e a aumentar a produtividade ao máximo;
2) com a taxa de câmbio valorizada e com o financiamento externo barato para as importações, há forte estímulo à introdução de máquinas e equipamentos que dispensam mão-de-obra;
3) a reestruturação em curso do sistema bancário e de outros serviços, com crescente informatização, também contribuirá para reduzir o potencial de criação de empregos;
4) finalmente, a crise fiscal dos governos estaduais e municipais continuará pressionando o setor público a reduzir seus quadros de funcionários.
Entre 1990 e 1992 (abertura com recessão) o país perdeu 2 milhões e 150 mil empregos formais. Nos anos de 1993 e 1994, com a recuperação da economia, foram criados cerca de 500 mil empregos, mas a reversão do crescimento em 1995 para sustentar o Plano Real cortou quase 380 mil vagas.
O modesto crescimento em 1996 agregou poucos novos empregos, de tal forma que de 1990 para hoje o Brasil perdeu 2 milhões e 50 mil empregos em todas as atividades.
É relevante observar que, segundo os dados da Rais, esta eliminação de empregos originou-se nas empresas de médio e grande porte, enquanto, de outro lado, as micro e pequenas empresas continuaram absorvendo pessoal. No total, o país acumula, hoje, cerca de 4,5 milhões de desempregados! Além disso, cerca de 2,7 milhões estão precariamente ocupados, sem carteira assinada, ganhando menos de três salários mínimos e procuram emprego por estarem insatisfeitos.
Ao todo são 7,2 milhões buscando trabalho. Ou seja, se somarmos o desemprego oculto ao aberto a taxa de desemprego alcançaria 9,7% da população ativa pesquisada (sem computar os trabalhadores desalentados que pararam de procurar emprego).
O grande desafio para o futuro da sociedade brasileira é o de criar novos empregos e ocupações. Além dos fatores já enunciados o Plano Real, sendo ainda incompatível com o crescimento acelerado, não viabilizará a geração de empregos no ritmo necessário. Por isso, a questão do emprego se inscreverá com peso dominante na nossa agenda pública.
Em simpósio realizado nesta semana pela Fundação Seade-SP, especialistas concluíram que:
1) a retomada do desenvolvimento acelerado -i.e., crescimento anual de 8% com taxa agregada de investimento superior a 23% do PIB- é a condição principal para criar empregos em escala satisfatória. Evidentemente, isso requer que o Plano Real seja reformulado para se obter uma combinação saudável entre as taxas de câmbio e de juros;
2) ante a tendência à automação, além do crescimento acelerado, será necessário reduzir gradativamente a jornada de trabalho;
3) o fomento às micro e pequenas empresas -grandes geradoras de ocupações- deve ser priorizado. O governo federal já avançou neste campo com o novo tratamento tributário simplificado -Simples. Mas este pode ser aperfeiçoado no que toca ao ICMS e ainda há muito o que fazer na esfera do crédito;
4) a implementação bem coordenada de políticas de desenvolvimento para a indústria, agroindústria e agricultura são, juntamente com a reforma agrária, indispensáveis à criação de novos empregos;
5) educação, treinamento, retreinamento e informação são essenciais para habilitar as pessoas a encontrar empregos/ocupações, e cabe ao governo a responsabilidade principal de atuação nestas áreas;
6) a maior flexibilidade de contratação/demissão e a redução das contribuições trabalhistas serão soluções ilusórias e paliativas. A flexibilidade pode ser benigna apenas no bojo de negociações coletivas equilibradas (contrato coletivo).
Esta parece ser a verdadeira agenda para o desafio do emprego.

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