São Paulo, segunda-feira, 23 de dezembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

25 metros de lenda

RUI NOGUEIRA

Brasília - Em um cenário apocalíptico (fim de século, seca mortal, monarquia se esboroando e fim da escravidão), ele morreu com 1,60 m aos 90 anos (1844-1934). Cresceu tanto depois de morto que hoje tem 25 metros -uma estátua à altura da lenda, lá em Juazeiro do Norte (CE).
Seis décadas transcorridas da sua morte, a história do "Padim Ciço" está interessando até pesquisadores portugueses. São tantos os prós e os contras, tantos falando tão mal e bem, que Cícero Romão Batista é o exemplo acabado da metamorfose que faz de um homem um mito capaz de mobilizar multidões.
Os pesquisadores (um historiador e um jornalista) trabalham em uma biografia. Tarefa difícil, tanto já foi dito e escrito sobre ele.
Ainda assim, "Padim Ciço" é uma daquelas histórias mal contadas do Brasil que não conhece o Brasil. E que teima em estacionar no reino do folclore. O missionário, milionário e revolucionário, já era uma figura estranha ao chegar a Juazeiro (1872), quando pouco mais de 300 almas habitavam aquele ambiente de desterro no Vale do Cariri.
O Conselho de Ordenação, presidido pelo padre Chevalier, anotou:"Tem idéias muito confusas e muita confiança em sua própria razão". Mais que isso, era esperto. A ponto de, anotou o mesmo padre, não se confessar na comunidade "desde muito tempo".
Como segredos são informação e informação é poder, padre Cícero sabia estocar ambos. Frequentava o posto do telégrafo de Juazeiro -o bastante para exercitar com segurança os seus dons adivinhatórios. Coisas que só ele e o telegrafista conheciam.
Testador de 31 sítios, 5 fazendas com benfeitorias e gado, 3 sobrados, 17 prédios, 4 quarteirões de casas e uma mina de cobre, Padre Cícero tem na fortuna -tudo doado à Ordem dos Salesianos- um dos focos da polêmica.
Dizem os inimigos que no período que passou em Roma para se defender da ameaça de excomunhão, o "Padim" purificou-se fazendo generosas doações à Igreja Católica. Nunca usou esses bens para explorar as pessoas, dizem os devotos.

Texto Anterior: Jesus perde para Mickey
Próximo Texto: A pirâmide e a máfia
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.