São Paulo, sábado, 28 de dezembro de 1996
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Progresso social insatisfatório

EDUARDO MATARAZZO SUPLICY

Ao se despedir do Senado, em 15/12/94, o presidente Fernando Henrique Cardoso alertou para "o imperativo ético de incorporar ao processo de desenvolvimento os milhões de excluídos pela miséria". Passados dois anos, o seu governo avançou apenas modestamente nessa área.
Diminuir a inflação de 47% em junho de 1994 para menos de 0,4% em novembro de 1996, registrando neste ano menos do que 10%, é feito marcante, com forte repercussão social, uma vez que a espiral de preços constitui um dos mecanismos que mais contribuem para concentrar renda e riqueza.
A estabilização resultou em ínfima melhoria da distribuição. Segundo o IBGE, o índice Gini, que mede a concentração, em 1995 atingiu 59,2, um pouco menor do que o de 1993, que foi de 60,3.
Não se pode estar soltando fogos. Basta lembrar que esse índice Gini é mais alto do que o obtido no último ano do governo Collor de Mello, 1992, quando atingiu 57,5. Em 1995, os 10% mais ricos detinham 48,2% da renda nacional, enquanto os 40% mais pobres recebiam apenas 8,95%. Apenas a Guatemala (59,6 em 1989) apresenta índice pior.
O resultado social insatisfatório se deve, em parte, à escolha dos instrumentos para alcançar a estabilização dos preços. A combinação de política cambial rígida com altas taxas de juros levou a que as taxas de crescimento do PIB fossem de apenas 4,1% e cerca de 3,0%, respectivamente, em 1995 e 1996, quando o Brasil poderia ter crescido pelo menos 7% ao ano. As taxas de crescimento do emprego subiram lentamente, com graves reflexos no aumento da violência e da criminalidade.
A forte desigualdade na riqueza, revelada pelo "Atlas Fundiário do Brasil", indicando que, em 1992, os 2,6% maiores proprietários detinham 56,7% da área agricultável, foi atacada com a desapropriação de 3 milhões de hectares e o assentamento de 100 mil famílias. Na verdade, segundo o MST, apenas 43 mil, pois as demais corresponderam a regularizações de assentamentos anteriores. São passos aquém da necessidade, fazendo o governo tomar dois grandes sustos: os massacres de Corumbiara e de Eldorado do Carajás.
O governo FHC se caracterizou pela agilidade com que criou o Proer, para prover recursos creditícios e renúncias fiscais, com o objetivo de resgatar instituições financeiras do naufrágio; pela rigidez de sua política salarial e pela lentidão com que enfrentou o poder dos latifúndios. Estes conseguiram assegurar que fosse apenas módico o ITR a ser cobrado sobre o valor de suas terras. O governo nem sequer cuidou de assegurar uma cobrança mais eficaz e que os proprietários declarem com correção aquele valor.
O presidente vem deixando passar a oportunidade de implantar um instrumento que realmente poderá contribuir para compatibilizar o crescimento, a estabilização e a erradicação da miséria: a implementação, em todo o país, de um programa de garantia de renda mínima, o qual tem contribuído para diminuir o trabalho infantil nas cidades que já o instituíram. Será uma forma de combinar justiça social com investimento em capital humano.

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