São Paulo, domingo, 4 de fevereiro de 1996
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Nitroglicerina

FERNANDO RODRIGUES

BRASÍLIA - O ministro do Trabalho, Paulo Paiva, decidiu mexer com um material explosivo. Nitroglicerina pura. Quer "flexibilizar", uma palavra sua, 12 dos direitos trabalhistas garantidos pela Constituição.
Se prosperar a idéia do ministro, a mulher que der à luz uma criança poderá, dependendo do seu contrato coletivo de trabalho, ficar sem os 120 dias de licença-maternidade.
É, numa primeira análise, uma proposta hedionda essa do ministro Paulo Paiva. Afinal, que tem coragem de dizer que uma mãe não deva ter alguns meses para se dedicar exclusivamente a um filho recém-nascido?
É justíssimo que exista a licença-maternidade. Na Suécia, dizem, a licença é de 12 meses. Que maravilha, não fosse o estado pré-falimentar do "welfare state" desse país escandinavo.
Já nos Estados Unidos, não há lei que garanta licença-maternidade. Empresas concedem esse tipo de benefício de acordo com políticas próprias.
Infelizmente, no Brasil esse tipo de direito foi incluído na Constituição por motivos passionais, desprovidos de razão. No caso da licença-paternidade, a tese era dada como perdida. Um parlamentar chorou em plenário e o leniente Ulysses Guimarães permitiu que a proposta fosse aprovada.
O que as pessoas parecem não entender no Brasil -principalmente muitos sindicalistas de esquerda- é que o país precisa conhecer os seus limites. Um passo maior do que a perna não gera riqueza. Apenas reparte a miséria.
Paulo Paiva quer manter o direito na Constituição. Mas sugere que a licença-maternidade -assim como férias, descanso semanal remunerado, entre outros- passem a ser facultativos na hora que trabalhadores e patrões fizerem um contrato coletivo de trabalho.
É fácil de prever que categorias fortes vão manter os direitos. As fracas, ficarão com pouco ou quase nada.
Será uma lei do cão, dirão. Pode ser. O ministro José Serra (Planejamento) propõe leis complementares para proteger categorias menos favorecidas. É uma saída.
O que não pode continuar é parlamentares chorarem em plenário e a Constituição brasileira passar a incorporar direitos que não têm relação direta com a realidade econômica do país.

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