São Paulo, terça-feira, 6 de fevereiro de 1996
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1984 é hoje

CLÓVIS ROSSI

DAVOS - Sessão sobre "O após-México", na tarde de sábado, no Fórum Econômico Mundial, a maior concentração de personalidades do planeta.
À mesa, os sobrenomes são Dlohuy (tcheco, ministro de Indústria e Comércio); Gurria (mexicano, chanceler), Kato (japonês, vice-ministro de Finanças para Assuntos Internacionais), Kolodko (polonês, ministro de Finanças) e Malan (brasileiro, ministro da Fazenda).
O que os unifica, além de importantes funções públicas em seus países?
1 - O inglês. Não é a língua original de nenhum deles, mas falam todos à perfeição, menos, claro, o japonês Kato. Não por má-formação, mas pela dificuldade fonética natural.
2 - A formação. Todos passaram por um dos templos acadêmicos do Ocidente. A saber: Louvain, na Bélgica (o tcheco); Leeds, na Inglaterra (o mexicano); Princeton, nos EUA (o japonês); Berkeley, nos EUA (Malan). O polonês foi "schollar" da Fullbright nos Estados Unidos.
3 - As idéias. Falam a mesmíssima e dogmática linguagem: orçamento equilibrado, abertura da economia, competitividade e, quando ainda é o caso, privatização.
Não é um exemplo isolado, mas a regra. Basta dizer que, no mesmo sábado, pela manhã, um debate sobre o Mercosul reuniu um norte-americano e cinco latino-americanos. Só se falou inglês e as idéias eram basicamente as mesmas.
É claro que, aqui e ali, pinta uma declaração sobre o social. Mas soa mais a gesto politicamente correto do que ênfase firme.
Nada contra nem o inglês nem as idéias em si. O que assusta é a uniformidade. Dá a impressão de que causaria mais surpresa e repulsa, nos círculos dominantes, alguém que resolvesse defender outras ênfases do que um marciano que desembarcasse na sala, com antenas, pele verde e tudo o mais.
Está se criando um círculo de ferro em que idéias fora do consenso liberal simplesmente são proibidas de penetrar. Menos mal que um liberal de nobre cepa, sir Samuel Brittan, editor-assistente do "Financial Times", adverte: "A maior heresia da nossa era é aceitar a ditadura da maioria e identificá-la com democracia".

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